Imagem do julgamento do rei Salomão e as mulheres que reivindicavam a criança. Internet/Livre Uso/Divulgação |
Quando o rei Salomão teve de decidir com quem ficaria uma criança que duas mulheres reivindicavam ser a legitima mãe para então ter a guarda da mesma, ele ameaçou cortar a criança ao meio para que cada uma das mulheres ficasse com a metade. Assim – diante da postura das duas – se faria justiça.
Mas uma delas então implorou que não,
pois de nada valeria ter a metade da criança se ela estivesse morta. Já a outra
considerou a decisão do rei – justa. O rei então concluiu que a verdadeira mãe
do menino era a que abria mão da criança para permitir que a mesma permanecesse
viva.
Há uns três meses resolvi adotar um bigode sob meu nariz.
Nunca tive – passei a ter.
Meu pai, Alberto Mathias Ody |
Remexendo fotos antigas percebi que meu pai Alberto usava bigode. Às vezes saliente, às vezes quase imperceptível - mas sempre esteve lá. Sem nunca ter pensado nisso, de repente fui deixando crescer, crescer, e quando me dei conta as pessoas já não me saudavam mais pelo meu nome, mas o faziam chamando atenção para meu bigode.
Tal qual as mães que foram ao rei Salomão, aos poucos fui descobrindo que a torcida se dividia. Havia e há os que acham que fiquei dez ou até 20 anos mais jovem e outros entendendo que na mesma proporção, envelheci. Menos né. Menos. Na ponta do calendário tenho os mesmos anos que teria com ou sem bigode.
Vai daí que agora estou num dilema.
Uns entendem, quase sempre mulheres,
que fiquei mais bonito. Meu Deus!
Outras que não fiquei mais feio.
A Vanda Groch me disse: “Parabéns.
Ficaste muito, mas muito mais jovem.
A senhora Helena, cujo sobrenome não
sei, mas é irmã de um homem que muito
fez pela cidade, dentro do Caitá quase gritou: “Meeeuuuus parabéns Ody.
Parabéns pela coragem de mudar! E estás bem mais jovem. Ficaste muito bem”.
No Colosso da Lagoa o Cezar Caldart
foi direto como a zaga do Brasil (Pel) que tirava todas investidas do Ypiranga.
“Posso ser sincero Ody... Tu não vai te chatear? O bigode não te fica bem na
televisão...”. Era o primeiro que me dizia o que eu também achava.
A Maria Lúcia Carraro Smaniotto (Lú) então – reabilitou
o espírito do seu tio Geder.“Não! Mas o que é isso!? - de bigodinho”, disse ela
enquanto fotografava a patrona da Feira do Livro deste ano, Zeni Bearzi e o
homenageado especial da feira, Giorgio Corradi, no plenário da Câmara de
Vereadores.
“Afinal, o que tu achou Lú?”, me
atrevi. E ela – sendo um pouco Geder, um pouco sua mãe Romilda e sendo muito Lú:
“Meu Deus. Horroroso. Tira isso daí Zé!”, setenciou.
Me senti como se estivesse diante de
um Salomão de calça comprida. Só lhe faltava a espada, embora reconheça haver
línguas ainda mais afiadas e a Lú, quando quer - sabe cortar. Ah, sabe.
E assim tem sido meus dias.
Na família vai da indiferença aos que
elogiam e os que criticam: “Ficou muito bom”, “Credo – nada a ver”, “ficou
muito bom vovô”, diz o meu neto Benjamin desconsiderando a imagem de décadas –
pesando só de uns três a quatro anos para cá com o presente. Por isso mesmo – o considero
muito autêntico.
Ainda ontem na TV Erechim a Sandra disse que me tinha caído muito mal, o presidente da Accie, Darlan Dala Roza, opinou que ficou bom e a dra. Saionara Salomoni fechou com a Sandra - "não ficou nada bem".
À noite na primeira reunião da Academia de Letras a Lúcia Pagliosa engrossou a ala dos acham que está muito bem, no que foi seguida pela mãe dos poetas erechineneses Nelly Cantele e, de novo, pela Maria Vanda Groch com apoio da patrona da 25ª Feira do Livro, Zeni Bearzi. Ela tambe´m observou: "deixa. Eu gosto". Dos homens não ouvi um pio. Ninguém se pronunciou.
Eu de bigode, recente. |
Pois é. O que que eu faço!?
Deixo e fico “horroroso”?
Convivo com uma imagem ruim, feia na
TV?
Porém, se cortar já vejo a onda vindo: “mas
por que cortaste? Estava tão bonito (?). Estavas bem mais jovem...”.
E então a vida segue assim: dependendo com quem cruzar estarei mais velho ou muito mais jovem. Já saberei que para esse, essa ou aquela estarei melhor, ou pior, muito bem ou horrível.
Aí me bate uma filosófica reflexão de barbearia movimentada ou de botequim cheio: “Adelar, ou Ody – o problema não está em você, no teu bigode ou sem
bigode – mas na cabeça, na percepção, na unicidade de cada pessoa, blá, blá,
blá...”.
O rei Salomão conseguiu propor uma
decisão que deixou todos satisfeitos. Sim, pois na hora “h” a verdadeira mãe – com seu “não; por Judá ou Javé - não corte a criança ao meio. Deixe meu filho viver nem que seja no colo de
outra” também se satisfez salvando primeiramente o menino - seu filho. Depois seu futuro com ele. A impostora salvou sua imagem aceitando a proposta do rei - que se revelaria com o passar dos anos um baita mulherengo. E no desfecho do caso salvaria à reboque - o rei com sua audaciosa, porém sábia e milenar proposta/decisão. Foi um daqueles casos em que todos saíram ganhando.
É de se pensar sobre essa histórica lição.
Acho que vou cortar meu bigode.
Mas vou dar uma de Salomão: cortar pela metade.
Assim poderei sair às ruas – satisfazendo
os que me acham mais jovem ou mais velho, melhor ou pior com ou sem bigode. Isso mesmo. Já que as opiniões divergem, com suas razões; vou ficar
com meio bigode.
Maaasss qual dos lados vou cortar?
Será que isso importa?
No caso levado ao rei, uma
vez a criança cortada ao meio, não haveria discussões. Todos chorariam ou alguém derramaria lágrimas de cinema.
Já nos dias de hoje – considerando a terra natal de Macunaíma -, onde a opção republicana destronou o rei e a última palavra; posso vir a ser acusado de coisas bem piores do que o “horroroso” da Lú.
Se cortar o esquerdo dirão que sou um
bolsonarista, um fascista, um genocida, um golpista, um judeu, um Trumpista...
Se cortar o direito me acusarão de
lulista enrustido, de ladrão, de comunista, de terrorista do Hamas, um Madurorista (?)...
Mas e eu – qual é mesmo a minha
preferência!
Que enrascada fui me meter!
Por que mexer numa coisa que
atravessa oceanos de tempo sem ser notada e de repente, sem pensar nas implicações
de uma simples e despropositada novidade na imagem – o mundo, o meu mundo
começa a provocar reações na cabeça de amigos, conhecidos ou desconhecidos – e aí toda vez que saio às ruas ou apareço na TV ou vou a um encontro, lá
vem o que em sete décadas, nunca deu sinal.
Eu sem bigode há mais de ano |
E... onde fica McLuhan (o Marshall)
com sua máxima “o meio é a mensagem” –
que em grossa ou fina análise unifica meio, mensagem e corpo (este como extensão do meio e tudo isso 30 anos antes da invenção
da internet) – logo, com bigode ou sem bigode, trata-se de uma questão de comunicação e, por isso; divide opiniões, pessoas e se não corrigida a
tempo, contida ou apaziguada (como se fosse possível isso nos dias de hoje), pode acabar em um levante de “exércitos” de contrários ou favoráveis, cada qual com a sua razão, a sua vontade, o seu intento; assim como as mulheres na queda de braço pela criança há mais de 900 a.C. levadas ao rei. No meu caso, tudo por um simples bigode.
“Pois bem. Tragam os dois lados até mim.
Salomão que fique com seu deus Moloque e com sua espada. E com suas setecentas mulheres e trezentas concubinas. (Tadalafila!).
Que o Deus dos deuses me ilumine e esteja comigo.
Eis-me aqui espelho meu, espelho meu.
Vou cortar - mas o quê? - a minha Gillete tá prá lá de usada. Só desliza.
Sonia, ô Sonia; tu viu o meu Phillishave que comprei na Ferragem pra minha formatura em 1967 no Científico
do Mantovani?
"O que é Adelar? Por que gritar! Tá procurando o quê? Phillishave - isso é um aparelho de barbear? Mas esse aí eu nunca vi. Já olhou no lixo de eletrônicos? Quem sabe foi dado pro Benjamin levar na URI quando fizeram uma exposição de materiais antigos... E vê se faz essa barba... porque hoje gostaria que fosse comigo no jantar do Lions...".
Caixinha do Phillishave/dilvugação |
Mas eu vi esses dias o aparelho, mas aonde?
Que m. ficar velho.
Aiaiaiaiai - e eu de bigode!
Se cortar só a metade - um dos lados desistirá?
É o conceito do MaLuhan: tudo é comunicação.
P. q. p.
E agora?
PS - Não sou de escrever sobre mim,
muito menos de expor fotos minhas; mas neste caso não tem escapatória.