quarta-feira, 28 de setembro de 2022

A Luísa está entre nós

 

Luísa, nos braços da mãe Bruna e
o beijo do pai Eduardo 










Dia 20 de setembro, agora este último de 2022, foi uma terça-feira de sol em Erechim. Uma data Farroupilha com direito a desfile de cavaleiros e público. Parecia mais um 20 de setembro igual aos outros, mas na minha vida foi um dia absolutamente especial. Sim, porque nascia em Porto Alegre a pequena Luísa Holz Ody – filha do meu filho Eduardo e de Bruna. Eu ganhara uma neta.

A ansiedade era grande por diferentes motivos. A cesariana marcada para o início da tarde teria sido transferida para o fim daquele feriado Farroupilha. Depois fomos informados que voltara tudo para o início da tarde. Por volta das 15 horas chegou a notícia por mensagem enviada pelo Eduardo. A Luísa nasceu e tudo transcorreu bem.

Graças a Deus – é o que eu disse - e, imagino é o que todos os pais e avós dizem quando a tranquilidade se faz numa hora dessas.

Lembro de quando nasceu o Benjamin em 2017 em Erechim. São segundos, minutos e horas onde se pensa em tudo e, ao mesmo tempo, não se consegue concentrar em nada. É um período de tempo que passa na vida da gente, sobre o qual pouco nos lembramos, por quais corredores andamos, em que salas entramos, se sentamos numa cadeira ou simplesmente vagamos quase sem rumo. O que nos ocupa a mente é uma expectativa que se desfaz num repente e aí – Graças a Deus! - e, se seguem emoções, choros, abraços todos eles traduzindo alívio, calmaria, gratidão e felicidade. 

Se a felicidade não existe como perene, e é verdade; mas se apenas a identificamos em picos, em momentos que vão e voltam - o nascimento de uma criança é, certamente, um deles.

Já faz uma semana que nossa família está maior, mais agradecida e mais feliz. Que a pequena Luísa Holz Ody floresça embalada pelo ar primaveril (que também haverá de se impor neste Rio Grande), como uma flor que se faz viva para o encanto de quem se emociona, quietamente, na sua própria intimidade com o que vê nas belezas expostas com sua diversidade de cores e perfumes – emoldurando o ambiente sem custo e sem apelo para que lhe batam palmas.

Elas, as flores e as criancinhas recém nascidas, só precisam de chão, de água (leite), de terra e de luz, para, com suas maravilhas quase secretas, passem a iluminar a vida de quem as percebe, recebe e reconhece.

Que a Luísa, ao lado de seu papai Eduardo e de sua mamãe, Bruna, seja mais uma entre tantas flores que nos dão esperanças de que o mundo ainda não está perdido, apesar do esforço de muitos, para que nos precipitemos em penhascos construídos por nós mesmos.

Há uma semana o mundo, ou pelo menos o nosso mundo familiar, não é mais o mesmo porque contamos entre nós com a Luísa e tudo que ela simboliza neste momento, pelo que somos gratos à ciência e aos desígnios de Deus.  

Parabéns Eduardo. 

Parabéns Bruna. 

Que a pequena Luísa seja a luz que lhes ilumine o caminho em todos os dias de suas vidas enquanto família.  

  

domingo, 18 de setembro de 2022

Triste e vazio

 

 




Jair da Cruz, o Miúdo.. Crédito: Arquivo de Família

A Maurício Cardoso está mais triste. E mais vazia. Não sei se notaram. Sim, porque, ali no banco do canteiro central , bem em frente ao condomínio Erechim, falta alguém. 
Por anos e anos as folhas dos ligustros despencaram das copas e, algumas, se aninhavam no colo, no boné e ao lado do Jair da Cruz, o popular Miúdo como tornou-se conhecido de forma carinhosa.

Conheci o Miúdo através dos jogos de loteria que fazia e nos bares da vida. 


Mas o Miúdo se destacava por outras virtudes. Sempre com alto astral, sempre com brincadeiras, sempre colocando o “Seu Grêmio” como um farol de entretenimento e paixão, sempre com elogios ao “Canário” como gostava de se referir ao Ypiranga. Apaixonado por rádio, fazia dele um homem muito bem informado sobre a realidade - especialmente no mundo futebol - mas não só sobre o mundo da bola. Política era outro prato preferido, além das cenas e notícias importantes e curiosas.


"Miúdo", em casa e mais magro, com a camisa do seu "Canário".
Crédito: Arquivo de Família

O Miúdo era um sujeito que fazia das suas brincadeiras, da sua simpatia, da sua boa companhia e das suas gargalhadas, um contraponto ao seu biotipo de corpanzil alto, gordo e forte – aos seus bem mais de 100 quilos e, segundo alguns, de pé 48. Ninguém em sã consciência queria briga com ele, embora provavelmente não encontrasse nele um inimigo, talvez, quanto muito, um adversário se a tanto fosse levado.

Desde minha adolescência eu guardo a escalação de um time que existia só na minha cabeça. Eram nomes curiosos e, quando escalados por um técnico também meio gago, fazia a gente rir. E a tal da escalação o Miúdo adotou como uma saudação quando me via. E lá vinha ele com o time, imitando o técnico, como disse, também existente só na ficção: “O meuuuu time vai jogáá com Oooberdã; Paaataclã, Saaarará, Domingues e Caieira; Diabinho e Bem Feio; Marmelo, Elo, Pinguelo e Martelo”, e aí o Miúdio dava uma gargalhada que fazia farfalhar as folhas dos ligustros (hoje não mais existentes na Maurício).

Foi uma pena perder uma figura, um personagem, um cidadão perfeitamente incorporado à cena erechinense. Nunca vi ninguém falar mal dele. Nunca ouvi uma discussão dele com alguém. Perfeito não era porquanto tratava-se de um ser humano. Mas que ser humano. Que cara legal. Que amigo que se foi sem mesmo se despedir dos amigos. Um dia sumiu do centro da cidade para cuidar da saúde em casa. Mas jamais deixou de lado o rádio.


"Miúdo" ligado no "Tocando a bola" da 
Difusão. Crédito: Arquivo de Família
O Miúdo foi tão relevante no mundo das relações humanas de erechinenses de todos os naipes sociais – que -, francamente merecia uma homenagem da Câmara de Vereadores. Sim, porque uma cidade deve reverenciar os que ajudaram na economia, no esporte, na sociedade clubística, na religião, na imprensa, nas letras, no comércio, na indústria, na prestação de serviço. Deve ir além. Deve lembrar os profissionais liberais, as autoridades políticas e das demais áreas como Erechim produziu e produz, reverenciar as figuras que marcam. Mas uma cidade também se alimenta, se mantém, se identifica, respira e vive através de seus personagens das ruas, pessoas comuns e conhecidas de quase todos e por quase todos respeitada e, mais que isso, admirada. E o Miúdo foi um sujeito assim.

Atribui-se ao dr. Sigmund Freud que o “o luto deixa o mundo mais triste e vazio”. E com a saída de cena, da cena da Maurício, da cena dos bancos dos canteiros centrais, com o desaparecimento do boné, do colo, dos ombros, do corpanzil que as folhas dos ligustros procuravam para não beijar o chão, fazendo-se repousar em sintonia com aquela figura de corpo bem grande, de coração que acompanhava seu biotipo, aquela figura que gargalhava fácil e sem economia e que, por vezes, mostrava-se observadoramente silente, amistosa e admirada, pode-se garantir que a Maurício Cardoso, a cidade, enfim, não é mais a mesma que a marcou por décadas.  

Que pena o Miúdo ter nos deixado tão cedo, mesmo aos 72 anos. Por que não sentei mais vezes nos bancos ao seu lado para acalmar a alma com suas tiradas e gargalhadas? As folhas de ligustros não caem mais porque foram arrancadas com troncos e tudo – há tempos. Árvores floridas tomaram seus lugares, mas elas tiveram pouco tempo para descansar no colo e no boné do grande amigo e personagem no qual se transformou o Miúdo.

Mas, quando passo pelo canteiro central em frente ao Condomínio Erechim, ao lançar o olhar para o banco vazio, me vem a lembrança e ainda ouço: “Oooberdã; Paaataclã, Saarará, Domingues e Caieira...., ahahahahahahahah”.

Sim – Freud tinha razão: “o luto deixa o mundo mais triste e vazio”. No caso específico do Miúdo podia, muito modestamente,  "emendar" ao pensamento do genial psicólogo: mais triste e vazio - "do primeiro ao quinto".