quinta-feira, 17 de agosto de 2023

De “Pedruka’s” e 99 anos do Ypiranga F.C.

 

 


Neste dia 18 de agosto o Ypiranga F.C.  completa 99 anos. Trata-se de uma história muito rica do futebol local para os padrões de Erechim. Hoje é um clube que encontra-se na série “C” do campeonato brasileiro.

Há poucos dias fui procurado pela senhora Elvira Pungan Tafernaberry. Ela é esposa de João Pedro Tafernaberry, Pedruca – o maior camisa nove que eu vi jogar no Ypiranga ao longo do tempo que acompanho futebol.  Pois a esposa do craque deseja prestar uma homenagem ao seu filho Carlos Miguel que está de aniversário neste dia 20 de agosto. Ele só não seguiu os passos do pai por causa de uma sequência de lesões.  No entanto atuou em todas as etapas das categorias de base do Grêmio sendo inclusive capitão em algumas delas. Carlos Miguel era voltante. Mas, como disse, as lesões o obrigaram a largar o futebol. Decidiu estudar e seguir outras carreiras, com sucesso, como é descrito mais adiante em um texto da própria mãe.

Vislumbrei no contato com a senhora Elvira, uma forma de homenagear a família do Pedruca, seus filhos (em especial o aniversariante Carlos Miguel) e os 99 anos do clube. Do casal João Pedro (Pedruca) e Elvira vieram quatro filhos – Carlos Miguel, Juliana Cássia, Ederaldo Marcelo e Karen Luciana (in memorian) e cinco netos. João Pedro (filho de Carlos Miguel), Karin Cristina e Eduardo Gabriel (filhos de Juliana) e Leônidas (in memorian) e Laís (ambos filhos de Marcelo).

Retomando ainda sobre o grande Pedruca. Nascido em Uruguaiana, iniciou jogando pelo Rio-Grandense de Santa Maria, passou pelo Cruzeiro (POA), teve uma rápida passagem pelo São Paulo (SP) e veio para o Ypiranga nos anos 1960.  Considerando os gramados de hoje, a medicina, a preparação física, a fisiologia, enfim, tudo que cerca um jogador de futebol – entendo que Pedruca teria condições de jogar por um clube da série “A”. Ele era atacante, mas sabia armar, finalizava com as duas pernas e tinha um porte físico de muita força. Embora não sendo um jogador alto - era dono de uma impulsão fora dos padrões normais com ótimo tempo de bola para o cabeceio. Pedruca era, em última análise, aquele tipo de jogador decisivo. 

Mas – a par do aniversário do clube neste dia 18 -, vejamos as palavras da senhora Elvira para o seu filho Carlos Miguel que aniversaria dia 20.


Carlos Miguel, filho de Pedruca, no Grêmio aos 15 anos. Foto: Arquivo de Família.

“Hoje ao acordar lembrei-me da querida Erechim pela qual tomei mais do que gosto – amor. E, lembrei-me que em não podendo estar junto do Carlos Miguel no dia do seu aniversário, poderia deixar uma mensagem para ele. Lembro que estudava no Colégio Medianeira pela manhã e, à tarde quando terminava as tarefas corria para o campinho jogar futebol. Às vezes ligava para o Marcelo seu irmão menor onde jogavam juntos. O objetivo era ser uma espécie de “Os Pedruka’s”.

Aos 13 anos, sempre incentivado pelo pai, foi para o Grêmio fazer teste nas categorias de base. Aprovado – jogou pelos infantis, juvenis e juniores. Por sua natural condição de líder – inúmeras vezes foi capitão dos times nessas categorias. No entanto, quis o destino, que o Carlos Miguel acabasse convivendo com uma série de lesões levando-o a abandonar os gramados. Uma pena, pois ele tinha todas as condições de tornar-se um grande jogador – como o seu pai foi.

Formando em Administração de Empresas na PUC, iniciou-se em outras atividades. Concluiu também o curso de Direito iniciado em Erechim e formado em Vacaria.  Atualmente o Carlos Miguel exerce sua função como servidor público no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) em Estrela. Ele é casado com Andréa, professora, e tem um filho que leva o nome do avô João Pedro Tafernaberry. Muito adoentado, o vovô Pedruca não teve tempo de esperar pelo netinho e partiu exatamente um mês antes do nascimento – em 1º de fevereiro de 2016.

Quero dizer que me orgulho de todos da minha família. Do meu marido, o Pedro (Pedruca que nos deixou há oito anos), dos nossos três filhos e cinco netos. Desejo um feliz aniversário ao Carlos Miguel e perdoe não poder estar aí nessa data.  Que Deus proteja a todos eles”.

A par desta mensagem, me associo aos cumprimentos. Para o Carlos Miguel que conheci desde pequeno e ao clube Ypiranga – este de aniversário neste 18 de agosto e o primeiro, domingo, 20. Como se percebe claramente, Carlos Miguel tinha tudo para seguir os passos do pai, e quem sabe ir até mais longe – mas foi vitimado pelas lesões. Menos mal que amparado numa sólida formação familiar, encontrou outro caminho onde pode manter sua família e também sentir-se realizado.

Ao Ypiranga F.C. que depara-se com seus 99 anos fechando a sétima tentativa de subir para a série “B” do campeonato brasileiro, resta a convicção de uma história de muitos desafios superados enquanto time de futebol e, especialmente, enquanto entidade esportiva que aprendeu a conviver com reveses e também a superá-los.

Não há por que lamentar mais uma tentativa de não alcançar seu objetivo maior, a série “B”. Tenho para mim que um clube de futebol depende de inúmeras outras variáveis, que há bom tempo, a cidade de Erechim não consegue atender e que são essenciais para a concretização mais viável do sonho ypiranguista.

Pedruca em 1967 no Ypiranga

Por fim uma última observação: os aniversários e datas deste gênero não servem apenas para comemorar como se um objetivo fosse alcançado – mas, deveriam servir; sobretudo, para celebrar a história, a caminhada diária das mesmas, onde desafios, decepções, tropeços, conquistas, tristezas e alegrias se conjugam. A caminhada – esta é a vida. 

Então – Parabéns Ypiranga F.C., parabéns ypiranguistas, parabéns Carlos Miguel. E parabéns, por que não à senhora Elvira – que sente-se honrada com o legado que continua sua caminhada por todos de sua família – uma espécie de eternos “Pedruka’s” dentro ou fora dos gramados, alcunha que imortalizou-se no camisa “9” do clube das cores nacionais na década de 1960.

Nove vez fora temos então os 99 anos do Ypiranga lembrando do seu maior "9".

 

sábado, 12 de agosto de 2023

De joseadelarody@terra para drandrewscorte@ceu

 

 

Dr. Andrews Corte - Foto: Arquivo de Família



Por José Adelar Ody*


“Estimado amigo.

Já se passou mais de um mês e eu não escrevi 

nada pra você.

Não conseguia e nem agora – mas preciso.

Não sei o que dizer nem por onde começar.

Andei verificando algumas coisas para depois

da morte.

A medicina, no geral – salvo exceções prega o fim de 

tudo.

O cristianismo prega a ressurreição.

O ateu não acredita em nada.

O espiritismo, por estudar mais o espírito,

defende que a alma é o espírito encarnado 

e o espírito é a alma desencarnada.

E assim por diante há dezenas ou mais de

outras crenças.

Diria – não importa – ou talvez “importa mais

do que nós mortais” podemos imaginar com o

que sabemos até hoje.

Então fiquemos neste contato sobre o que

vivemos por aqui.

Mas eu – respeito todas as crenças; inclusive as

descrenças.

Vou tentar lembrar de alguns encontros nossos.


Por exemplo, durante uma consulta:

‘Sim, sim, certo, certo, a-hã, sim, a-hãã...

E a secreção é amarela mais clara...

Quando começou a tosse.

A-hã, A-hã, sim...a-hã, a-hã...

E ela é seca ou solta catarro junto?

Sim... a-hã... tá, certo, certo....

Quando você tosse a dor nas costas é aguda ou 

contínua? A-hãã.

No peito também tem dor ou só quando tosse.

Sim. A-hã, a-hãã...

Meu amigo Ody – tira a blusa, a camisa e senta 

ali na maca.

Respira fundo, mais fundo, mais... Puxa o ar e solta... puxa até onde pode e solta... Isso, isso, a-hã, a-hãã, a-hããã... Está bom.

Vamos ver o nariz... abre os olhos... abre a garganta. 

Mais... diga ahh, ahhh, de novo.... ahhhhhhh. 

Pronto.

Pod(i) colocar a roupa.

Agora vamos fazer um teste prático.

Olha como eu faço.

Pega essa bombinha, olha, assim ela abre –

depois... fecha. Entendi!

Tu vai soprar todo ar dos pulmões pra fora, assim ó, fuuuuuuuuu, aí tu abre a bombinha assim ó; coloca o bocal entre os dentes e aspira, puxa de uma vez só, entendi, ufffffffffffff, isso, de uma vez só. Vamos lá. Segura o máximo que pode e libera.... espera um pouco respira, e repete de novo. Assim ó!

Vamos lá. Enche os pulmões, expira. Larga todo o ar Ody. Tudo. Tudo. Limpa. Agora bota a bombinha na boca e puxa, puxa, inala o pó de uma vez só... faz o máximo de força. Uuuuffffffffffffffff. Isso e agora - larga devagarinho. Isso...

Tu vais fazer assim três vezes ao dia. De manhã, de tarde e à noite – compreendi! Aqui tem para 120 vezes. Cada vez diminui um e tem um marcador, olha aqui, entendi! Este eu vou te dar... tu não vai precisar comprar na farmácia – compreendi!

Meu amigo Ody... tá tomando alguma coisa?

Sim, sim, tá, a-hã, a-hã... Tá bom. Por enquanto continua só com este pra dor e tu vai fazer um raio X lá no “Caridadi”, e estes exames de laboratório. Certo? Compreendi!? Quando estiverem prontos tu me traz, mas não te preocupe. Não vi nada de mais sério.

Ah – e faz um exame de Covid, você não teve né; isso – tu fez um exame numa farmácia, mas agora repete no “Caridadi” que é outro método - e me traz tudo. Eu acho que não tem nada demais, mas vamos investigar. Certo!?

Meu amigo Ody! Tu que sabe tudo (?)... quem vai ganhar a eleição. Lula ou Bolsonaro. Também acho. E no estado? O que tu tá achando do Polis? Olha – no Santa onde faço muitos plantões na UTI... Pois é. Ahahahah... mas sempre é assim, quem está no poder sempre tenta o melhor, mas – e tu sabe disso muito bem – a saúde é uma área muito delicada, muito; sempre vai ter alguém reclamando – compreendi, mas a gente faz o que pode.

Meu amigo ody - vai tranquilo, faz os exames e depois volta. Ah, essa bombinha tu leva junto e não esquece de fazer como mostrei. Tu vai melhorar. Uma vez de manhã, uma de tarde e uma de noite, depois fecha bem – compreendi!  Abraço.’.

Pois é Andrews, jamais vou esquecer de como tu me recebia no consultório e sei lá quantas vezes, sem ter consulta marcada, ligava para a secretária Vilse e ela, sempre atenciosa  “está cheio, mas vou falar com ele e depois te retorno". Dali uns instantes o telefone tocava e a Vilse  com sua voz macia: "Ody pode vir lá pelas 5. Ele vai te atender...". Impagável – e o pior: não me cobrava mesmo. Ah – Andrews... ! A propósito soube de outras iniciativas tuas na medicina, mas melhor deixar como está para ver como fica.  

Entrei no Hospital de Caridade lá pelo início dos anos 1980 ou meados daquela década, levado pelas mãos do grande Antônio Pereira de Souza. Se não me engano – tu chegou quase no mesmo período. O “Seu Antoninho” soube que eu voltara de Porto Alegre e queria alguém para redigir notícias para o HC. Ele sempre gostou de jornalismo, etc...  Também lá fundei o “Mensageiro da Saúde” um jornalzinho com cara de revista que depois revista virou mesmo.

Quando a dona Maria (Amorim Smaniotto) começou a participar mais da direção, até assumir a presidência; eu caí nas graças dela e criei o Programa de Rádio “Vida e Saúde”, apresentado todos os sábados na rádio Difusão. Durou, imagina, 22 anos Andrews.  Em 2010 o programa foi retirado do ar por decisão da direção do hospital – o que pessoalmente considerei um equívoco, não por mim, mas pela divulgação que propiciava aos médicos, aos enfermeiros, à própria administração e direção do hospital e, principalmente ao público. Até hoje, 13 anos depois, pessoas me perguntam por que o programa saiu do ar. Digo sem receio que dezenas ou mais, de consultas médicas com os mais diferentes profissionais se deram pela divulgação feita no programa.  As pessoas em casa, parece que se identificavam com determinada explanação de um médico a respeito de um problema ou doenças abordadas, e depois procuravam o médico, ou ligavam pedindo onde trabalhava, etc...

Pois é Andrews, e deste programa foste um pilar, ao lado do dr. Milton Serpa entre outros tantos. Lembro que lá por 1988 quando iniciamos na rádio, um dos médicos que mais se dispunha a dar entrevistas era o Dr. Celso Lago – mas depois ele foi diminuindo as aparições no programa, mas sempre estivemos abertos a todos – e reitero – Andrews, tu foste uma espécie de garantia do "Vida e Saúde". Quando não conseguia alguém para o próximo sábado – a dona Maria já ordenava: "Zé... oh Zé... liga pro Andrews ou pro Milton (Serpa) -  que um deles vai...” e era dito e feito. Perdi as contas de quantas vezes me tiraste de situações complicadas, na condição de médico e de amigo.


Certa vez, bem lá longe no tempo, eu andava com fortíssimas dores nas costas, de um lado só.  Você me atendeu. Concluiu que eu estava com um derrame pleural. Não quero lembrar do tamanho da agulha, mas foi um alívio imediato.

Certa vez me recomendaste ler “Barriga de trigo”, um livro sobre obesidade, trigo obviamente e seus derivados onde a obra faz uma espécie de evolução da semente, etc.  Muito interessante.

Andrews, acompanhei quase todos os dilemas e tragédias que também te  castigaram enquanto pessoa. Sei dos sofrimentos e – incrivelmente você  não falava sobre essas coisas. Com exceção de uma delas tomando partido da tese que mais tarde viria se confirmar como um episódio injusto para com uma pessoa das tuas relações. Você tinha mais que convicção, certeza do que dizia.

Depois que tu partiste, meu caro amigo, eu fiquei pensando sobre o tipo de profissional, sobre o tipo de médico e sobre o tipo de pessoa que tu foi. E creia, estas marcas são teu currículo, tua história que não apenas eu, mas centenas ou milhares de pessoas podem atestar. Com quem eu falo – não se ouve nada mais que elogios à sua grandiosidade enquanto médico e “figura humana”.

O compromisso com o consultório, o comprometimento com o paciente internado e a verdadeira paixão que tinhas por trabalhar em UTIs – sintetizam tua vida como profissional da medicina. Sei que não acumulaste fortuna e sei do teu amor pela Glaucia – que conheci nos no JB quando por lá passei. Diziam que eu era professor do curso de Redator Auxiliar. Quando soube que estavam juntos fiquei feliz por ambos.

Hoje fico pensando na tua luta contra o fumo, nos ensinamentos que davas nos programas do HC na Difusão, na insistência e nos apelos que fazias quase em voz mais alta que o necessário, alertando para os males deste vício.

Como estou escrevendo “sem um plano”, me ocorre agora e o faço antes que esqueça. Uma vez por causa de uma gripe ou algo do gênero, e já tinha experimentado de tudo como “médico de mim mesmo com a famosa auto-medicação”, fui até a UTI do Santa Terezinha. Era quase nove da noite. Me deixaram entrar. Você levantou da caminha que havia para “descanso” do médico plantonista. Não devia produzir esta verdadeira prova contra mim mesmo, mas sendo honesto, sincero e sabendo que talvez só você entenda isso – me confesso publicamente aqui. Com a tua afamada calma médica me atendeste e receitaste o que devia tomar. Que vergonha. Que desrespeito, que acinte uma coisa dessas – mas como eu o conhecia além da conta normal de um “bom dia”, de um “olá”, ou de uma consulta tradicional em consultório, porquanto éramos sobretudo amigos – eu cometi esta barbaridade e, nunca, jamais, falamos sobre isso. E mais - já que escrevo por instinto, lembro que há cerca de um ano você atendeu ao telefone uma ligação minha, porquanto já vinhas me tratando há uma semana e não melhorava, ademais, começava a fazer febre e você: "Ody - vai no plantão do Caridadí que teu caso é de internação. Mais tarde passo lá" Assim foi e às claras me disseste que por não atenderes mais pelo IPE estava me transferindo para o dr.  Gritti (Leandro), que gentilmente me acolheu e me tratou. Mesmo assim foste me visitar para ver como eu estava. 

Andrews - espero que ressuscitado ou em espírito, ou seja lá onde for, tenhas a mais absoluta certeza que o teu jeito simples como um profissional da medicina sempre disponível, tranquilo, dedicado à exaustão, colaborativo, estudioso, incansável, pregador de esperanças, preparado e inteligente, pois como disse; esperançoso sobre as mais diferentes crenças, nós ainda aqui pela Tôrres Gonçalves, na Itália ou na Amintas Maciel – você possa receber estas palavras como uma prova do meu respeito e da minha profunda admiração pelo profissional médico que foste e, sobremaneira, pela pessoa que representaste – em diferentes  momentos, períodos e fases, neste imenso palco de vida do qual foste um “maiúsculo” em profissão e dignidade. Defeitos, equívocos - todos podemos tê-los em maior ou menor grau, porquanto não somos perfeitos. Mas este não é o caso de especular sobre questões que geralmente nos levam a opiniões divergentes. No entanto - alguém duvida que o Andrews era uma pessoa do bem? Eu não.

Para finalizar, Andrews (sei que tu não te importas em eu omitir o dr. – o que é outro ensinamento), vou te contar meu sonho na noite de 5 para 6 de julho: eu estava em um velório. Que coisa! Me parecia na São Pedro, mas não era. Havia um caixão, mas não conseguia ver o falecido. Lembro que a dona Maria -  com quem tantos e tantos programas apresentamos juntos na rádio Difusão aos sábados às 11 horas – estava na sala, caminhando de um lado para o outro e dava ordens. Havia pouca gente, mas a dona Maria mandava isso, mandava aquilo, recomendava seu inconfundível “não é aííí Zééé... (como me chamava)”. Lembro ainda, no meu sonho, que havia um carpete vermelho naquela sala. Pouca gente, eu sem saber sobre o morto e a dona Maria vá ordens e ordens. Pela manhã  acordei, nem lembrava do sonho, mas por volta do meio dia soube que você havia falecido na noite anterior - na noite do sonho.  Reuni as peças estaríamos os três – agora na minha imaginação – naquele dito sonho?  Não sei os outros, mas eu às vezes até me esforço para reunir passagens e imagens perdidas de um sonho - tentando tecer um fundo que permita confrontá-lo com alguma realidade. O sonho foi real enquanto sonho - o resto pode ter sido apenas uma arquitetura de bobagem assinada por mim. Num contato casual durante aquele dia, com alguém ligado ao espiritismo, contei sobre o sonho e a realidade do dia acrescentando um “que coincidência!?” (Reitero - a gente busca relacionar tudo, não é mesmo!?). A pessoa com quem comentei deu uma resposta simples: “Não existem coincidências”.

À tarde quando fui me despedir de você, me deparei com poucas pessoas no local - na ante-sala do crematório da cidade. Aos poucos, porém, alguns colegas e amigos teus foram chegando e se juntando aos teus familiares.  Quando o caixão foi “sugado” para o quê entendo seria o crematório, sumindo por entre tiras de plástico, acredito; como se fosse uma cortina, abaixei a cabeça para pensar não sei sobre o quê. Quem sabe sobre o propósito da vida, a brevidade da vida... E, sem relacionar com o sonho porque só fui me tocar no dia seguinte, o chão daquela sala funerária estava coberto por um lindo carpete vermelho.

Ah, ia esquecendo. Tua neta Bianca, que tanto gostarias de presenciar a formatura em medicina este ano, estava lá. Muito sentida, como seria de esperar – mas comedida e sem alardes – estampava no ouvir, no caminhar, no pouco falar, no observar, enfim, mantinha uma postura de absoluta e comovente serenidade – (nós jornalistas teimamos em prestar atenção nessas coisas – e eu mais ainda), pois, ela estava como disse; sentida – porém serena - denotando um claro preparo para honrar as melhores tradições da medicina, especialmente das tuas relações e com os quais conviveste. 

Me perdoe escrever assim meio ao acaso, aparentemente sem início, meio e fim - poderia ter melhor distribuído o texto cronologicamente - mas o fiz porque passava da hora. Por isso algumas coisas podem ter ficado um tanto fora de lugar, outras esquecidas (ah - teus cafés semanais na casa do dr. Silvio - Smaniotto)... Pena que o texto possa ter pecado por certa falta de coerência, pois esta é uma cobrança que eu mesmo me faço.  Mas em termos gerais é isso. Por aqui a vida segue sem sobressaltos. A única certeza que temos é que a despeito da separação, a cada dia estamos mais próximos. De novo. Aonde nos encontraremos - não sei. Gratidão e um abraço. 








Saudades eternas,

José Adelar Ody – seu amigo”.   


Obs: Todas as fotos são do dr. Andrews Corte e foram fornecidas por Glaucia Corte.

José Adelar Ody é membro da Academia Erechinense de Letras*