Sem
preconceitos e sinceros com nossa própria sinceridade, nunca se mentiu tanto.
Alguém ainda tentará salvar a
assertiva com o Salmo Preferido do Século 21: ‘que nada. Sempre foi assim.
Acontece que antes a gente não ficava sabendo e quando a notícia vinha – já
havia muito tempo. Hoje é igual ao que sempre foi só que hoje a gente clica e
vê o tsunami de 2004 na hora quantas vezes quiser. Leva numa caixinha de
fósforos (das pequenas) digital algo que se conhece por pen drive e ali estão centenas
de músicas ou de fotos ou de filmes...
Mas acho que
em termos de mentira ela caminhou sim junto com o tempo.
Sempre se mentiu – disso
ninguém duvida.
Mas nunca antes na história
desse... mundo mentiu-se e mente-se tanto.
Desde dentro de casa à sacristia.
Do emprego à política.
Da fidelidade à qualificação.
Do amor à saudade.
Do que se deseja a que se
pode.
Do que se tem ao que jamais
haverá de ter.
De quem se pegou a quem não
quer pegar a gente.
Da economia à... economia.
Da ilusão ao real.
Do que gostaríamos de ser –
ao que de fato somos.
Deitado a 45
graus numa cadeira de praia e vendo até onde a vista alcança do gigante de
água,
na areia toda a mentira se
desfaz como um punhado dela em mão fechada com água salgada.
Caminhando na areia a mentira
se veste de verdade e aí, bem aí, nada do que parecia é, nada do que diziam é,
tudo que se imaginava – não é.
Só uma coisa é: tudo é
verdade. E não é mentira!
Aquele cabelo, aquele
quadril, aquela barriguinha de tábua de pinho lustrado, aqueles seios de pêra,
aquelas pernas longilíneas, aquele vestido de festa da alta, aqueles cílios
postiços, aquelas unhas, dentes, lábios de pura carne, aquele daquela BMW,
aquela daquele Lamborghini preto, aquele patrão super bem de vida, aquela do 23º
andar, a do Ray Ban vermelho, aquele cientista, aquela empresária de fazer
inveja ao mundo do ramo masculino, aquele peitoral de Johnny Weismuller, aquele
alto e arrojado como Liam Neeson, aquele ‘dono’ da minha cidade, aquele todo
poderoso da minha cidade, aquela estrangeira, aquelas calças de marca, aqueles
bonés de marcona, daquelas bolsas de marca proibida aos comuns, aqueles ternos
de atores de Hollywood, aqueles braceletes de Cleópatra, aqueles modelitos em
carne e osso encabidados no último
ditado da moda que dita a moda – aonde estão que não os vejo!
Biquínis e tangas ou calções
não mentem.
Jamais.
E mais que isso, além de
nunca mentirem,
trazem consigo,
oferecem gratuita e
democrática e socialmente o que os adereços omitem, escondem em mentira
desavergonhada que uma simples praia desnuda e coloca à pés.
Fosse a praia com seu sol ou
nuvens, o mar com seus azuis, esverdeados ou até acinzentados,
fosse a praia com sua areia
miúda ou encharcada pela maré,
fosse o vendedor de picolé e
salada de frutas, de chapéus ou tangas,
fosse o grupo de pescadores a
decidir como desencalhar o barco e onde largar a rede,
fosse a caipirinha, o milho
verde, a cadeira, a barraca árabe, o chuveirinho e as palmas coletivas
sinalizando que uma criancinha está perdida da mão do pai
- fosse o barrigão que esconde,
tapa, omite, apaga qualquer sinal de genitália de Adão ou Eva,
fossem os chinelos de dedo
levados à mão,
os celulares, relógios,
bronzeadores, trocados de reais, chaves, caixas de isopor, latinhas e latões de
cervejas,
fossem as conchinhas
- governos,
e certamente teríamos um
modelo híbrido acasalando-se em um sistema democrata/socialista como jamais o
homem pelo homem conseguiu ver com os próprios olhos e experimentar com a
própria vida no seu dia a dia,
até por que,
aí já estarão os adereços da
mentira fazendo de tudo, com o consentimento do ser,
a verdade – a única verdade,
a última verdade.
Quando quem quiser descobrir
e ver-se um pouco de como de fato é, avaliando-se com os seus congêneres,
largue o apê de quatro
quartos e fina mobília,
largue o exagero de qualquer
circunstância,
largue o exibicionismo sempre
nefasto porquanto falso e sem utilidade prática alguma,
largue o euforia com a qual
um simples espelho a ou o engana,
largue a prepotência, a
arrogância, o neologismo do eumismo,
a conjugação apenas na primeira pessoa do singular.
Sim – quando estiver com
saudade de você,
jogue num canto ou esqueça
num outro canto da casa, do apê ou da vida
- o que nunca levarás
contigo, que só serve para iludi-lo, submetendo-o ainda ao ridículo que achares
que realmente és – aquilo que outros riem.
Bota um calção, enfia-te num
biquíni, mande vir uma caipira, deite na última fronteira entre a areia mais
seca e a onda mais longa do mar.
Se olhares para frente verás
mar-sem-fim.
Para os lados, verdades em
pé.
Para trás – a cobra tentando
seduzi-la com a maçã da mentira.
Para cima
– o céu azul sem
fim.
O infinito.
O espelho fiel do que és de cabo
a rabo, de cima abaixo.
A única verdade:
A praia não mente.