Glenio Renan Cabral, Mara Regina Rösler e Cleo Joaquim Ortigara - o Grupo Tarefa - Crédito: Arquivo Pessoal |
URI – esperança materializada sem mágica!
19 de maio. Aniversário da URI. 28
anos. Parabéns.
Qual foi o prefeito que mais contribuiu para o desenvolvimento do Alto Uruguai, do Médio Alto Uruguai, das Missões e de um pedaço da região Central do Estado?
Qual foi o prefeito que mais contribuiu para o desenvolvimento do Alto Uruguai, do Médio Alto Uruguai, das Missões e de um pedaço da região Central do Estado?
Na região de Erechim, por exemplo,
nos queixamos de não contarmos há muitos anos com um deputado federal. Mas,
quando os tivemos, que substanciais conquistas nos foram legadas para melhoria
da vida aqui pelo chapéu do Rio Grande!?
Não, não será na área política que
iremos encontrar a alavanca fundamental que deu vida nova, ou quem sabe, que
sinalizou com esperança de dias melhores, a quem se cansara de debater-se em
queixas generalizadas contra o esquecimento do Estado.
A pobreza econômica e social,
especialmente esta, indicava que algo estava gravemente em dissintonia, porquanto raízes étnicas bem fundas e, de boa espécie, acalentavam em caldo de uma
miscigenação muito plural - bem acima do que se poderia supor -, por dias melhores a cada uma das suas principais
cidades, como Erechim, Frederico Westphalen, Santo Ângelo e, mais tarde,
incluindo-se Santiago, Cerro Largo e São Luiz Gonzaga.
E foi na seara da educação - através
de uma espécie de “grito de independência”, que a barragem que insistia em
segurar no mais completo esquecimento a região quase abandonada, sob
o guarda-chuva DGE – 38, que ela própria reagiu e começou a mostrar que não
dava mais para segurar tanta “água” (problemas) represada.
Os anos 1990 ainda não haviam
chegado, quando a semente de união do tripé Erechim (Fapes), Frederico
Westphalen (Fesau) e Santo Ângelo (Fundames), foi deitada no solo dessas três
comunidades com o fito de constituir uma só Instituição de Ensino Superior
(IES), uma Universidade.
Quem conhece o mundo das negociações,
das interações sócio-culturais e dos relacionamentos humanos, onde brotam
especificidades pessoais de todas as sortes e de todos os azares; pode fazer
uma vaga ideia do que acontece num período aproximado de cinco anos para que um
sonho – vire realidade.
Este processo de nascença de uma
instituição como a que se desenvolvia no coração e mentes de alguns
visionários, que reuniu lideranças das mais diferentes áreas, de cidades
distantes e de IES que já tinham até ali sua própria história – transformou-se
(ou melhor seria – foi transformado) numa esperança pensada, projetada,
plantada, amplamente debatida e conquistada, por um punhado bem grande de
lideranças políticas, econômicas, religiosas, sociais e, em especial,
educacionais.
É de se imaginar o desafio que
tiveram aqueles que costuraram a construção de um projeto sólido, único e de
caráter insuspeito, sem ruídos ou com tiras soltas, para assim, levá-lo e
apresentá-lo em Brasília. Era o primeiro grande passo: a Carta Consulta.
Pense numa reunião de condôminos.
Pense numa reunião de qualquer
partido político.
Pense numa reunião de partidos
políticos para formar um bloco.
Pense numa reunião familiar com
vistas a decidir sobre quem vai cuidar do pai ou da mãe.
Pense na mesma reunião familiar com
vistas à herança?
Olha só o que se discute sobre o
Covid 19 – isolamento vertical ou horizontal?
Distanciamento social?
Cloroquina ou...?
Vamos liberar partes, setores, áreas
ou tudo antes que a economia nos afunde no pântano da desgraça?
Pense agora em Fapes, Fesau e
Fundames, tendo de abrir mão de seus patrimônios, de uma história, de uma
garantia (não se sabe até onde iria, mas enfim), para fazer surgir uma outra,
uma nova Fundação!
Seria um exagero comparar a missão
que os “costureiros” que lideraram o processo de confecção real da FuRI e URI
(Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões) com os 12
trabalhos de Hércules.
No entanto, considerando que uma está
no campo da mitologia e a outra no mundo de carne e osso, é possível, e até com
boa dose de razoabilidade, admitir que os trabalhos reservados a quem atuou na
linha de frente, foram algo sim, como os 12 destinados à Hércules.
Quem tem dúvida – coloque aí na sua
análise de avaliação, a consideração do que a mente humana é capaz. Ou seja –
boa parte do que se projetava e se movimentava na vanguarda com vistas à
criação de uma única IES, nem sempre era peça aplaudida e reverenciada.
Lembro aqui do dia em que a picareta
fez o primeiro buraco para erguer o Polo de Cultura. Um sonho do visionário
Jaci José De Lazzari. No entanto, às minhas costas, um reduzido grupinho de
observadores não se segurava: “esse Jaci é mesmo louco. Quando bota uma idéia
na cabeça...”. Anos mais tarde, vi muitos dos críticos da inovação –
discursando no palco do terceiro andar do Polo de Cultura, hoje incorporado ao
Patrimônio Histórico e Cultural do Estado.
O projeto de Universidade que a
região projetara por meio de algumas cabeças, e que acabaria sendo referendada,
fugia aos modelos tradicionais, porquanto trazia na sua testa e no
seu ventre um compromisso inarredável com as comunidades que lhe emprestaram
suas Fundações Educacionais.
Ademais, o ensino, a pesquisa e a
extensão, patrocinados pela nova instituição, teriam como endereço central o
interesse comunitário, os desafios comunitários e as vivências comunitárias –
buscando minimizar suas mazelas e potencializar suas virtudes.
O objetivo, enfim, era injetar sangue
novo, doses de ânimo numa auto-estima depressiva e revigorar a vida no seio de
regiões aparentemente divorciadas geográfica e culturalmente – permitindo, como
disse; o nascer de um novo porvir em meio a um torrão gaúcho abandonado no seu
todo pelo Estado. Talvez se salvasse aí a produção primária, mas mesmo assim, a
iniciativa primeira era localista.
Sugiro um exercício fácil e prazeroso.
Pense em como era Erechim antes e
depois da URI.
O que eram Frederico Westphalen,
Santo Ângelo e, mais tarde, incorporada a “terra dos poetas”, Santiago, e, mais
tarde ainda, Cerro Largo e São Luiz Gonzaga.
O que era e o que é o setor
imobiliário!
O setor de serviços!
O próprio comércio e a indústria!
Vivemos tempos de crise, sim, vivemos
– mas abstraia o câmpus da URI nas
cidades onde eles estão e repense estes tempos de tribulações, de agruras, de
colapso...
O que seria dessas pobres, esquecidas
e até então – quase desconhecidas terras!
Por estas bandas faziam filhos para a
escola pública, que depois pegavam suas malinhas de pau ou pano e rumavam para
Santa Maria ou Porto Alegre e – quantos voltaram para repassar o que
aprenderam? E sejamos honestos: tudo às custas do pai e família que na roça iam
tirar o sustento do filho em grande centro.
Com a URI – se constata que os ganhos
não são apenas os formandos que cursaram o ensino superior perto de seus
familiares.
Não é apenas um naco bem
representativo desse número – que uma vez formado, em sua cidade ou região
ficou para fazer sua vida profissional e contribuir para o desenvolvimento de
onde se criou.
Não é apenas o campo de trabalho que
se abriu para milhares de professores e funcionários.
Não é só a multiplicação da pesquisa,
das ações de extensão sem custo às populações mais carentes ou a elevação do
nível educacional, profissional e cultural neste pedaço de chão gaúcho ignorado
pelo Estado por décadas.
Junto com a Universidade, veio e
desenvolveu-se, o senso de que era, e é sim possível, dar vida própria ao
desenvolvimento regional sustentável; bem do jeito como todos aqueles que deram
sua parcela positiva de construção da URI, no modelo comunitário, o fizeram, e
olha - bem antes de 1992.
E sob este aspecto, como é
absolutamente impossível nominar a todos com suas contribuições, mas até em
reconhecimento a esses todos – entendo que se tudo pudesse ser sintetizado,
reunido ou representado em algumas pessoas, destacaria o Grupo Tarefa que
comandou todo o processo, levando à criação da Universidade Regional Integrada
do Alto Uruguai e das Missões, a URI.
Cleo Joaquim Ortigara (Frederico
Westphalen - a tenacidade), Mara Regina Rösler (in memoriam - Santo Ângelo - a
doçura) e Glenio Renan Cabral (Erechim - o equilíbrio), são sim, uma espécie de
pais da URI, pela singela razão de que ninguém mais do que eles, dedicou tanto
tempo, denodo, inteligência e esforço pessoal na construção desta
obra que por isto mesmo, não é filha de um esforço ilusionista, nem do acaso e
muito menos de um lance oportunista ou de sorte. Importa ainda observar que
Cleo Ortigara e Mara Regina chegaram a ocupar o cargo de reitor da
Universidade. Glenio Cabral, sempre o solícito chefe de gabinete. Tenho para
mim, que só não foi reitor porque nunca cogitou dessa possibilidade. Mas com
sua visão de bom senso e equilibro pavimentou uma relação de muito bom trânsito
em todos os câmpus.
Estas três pessoas, em primeiro
plano, conviveram de perto com disposições proativas de muitos e nem tanto de
outros, ao mesmo tempo em que devotaram-se ao convencimento, sem espaço para
respostas negativas, junto a receosos ou descrentes diante da novidade do
desconhecido. Era preciso compreender realidades distintas para promover a
conciliação, sem ferir suscetibilidades e, ademais, sem perder pedaços do
projetado pelo caminho. E isto exigia uma enorme capacidade de entendimento do
outro, uma hercúlea determinação e uma inteligência acima da média – onde às
vezes ceder um passo para ali adiante caminhar dois -, era um desafio que só
podia ser entendido e assimilado na sua integralidade por quem tinha tudo na
cabeça. Por quem compreendia com discernimento pleno por onde, em que
velocidade e como se devia, e podia caminhar, como disse – sem perder peças da
essência no percurso. E percebam - em um tempo ainda não apresentado ao mundo
das novas tecnologias que viriam a seguir, o que, obviamente, cortaria caminho
e aliviaria por demais do esforço de cada um e coletivo.
Não descarto que a orquestração de um
projeto tão amplo e complexo, não tenha por vezes, lambido a linha divisória do
abandono de tudo – considerando-se as particulares humanas, sempre tão
imprevisíveis e suscetíveis às surpresas, especialmente quando sob o patrocínio
da desculpa do risco de trocar o certo pelo duvidoso. Nestes casos, quase
sempre, a motivação tem por pai a ignorância.
Por isso mesmo, ninguém mais do que
eles, merecem quase na beira de três décadas desta construção, um
reconhecimento mais efetivo e concreto de quem hoje tem a responsabilidade de
levar adiante o sonho de muitos, a ação de outros tantos e a experimentação, ou
até mesmo a redenção, de mais de cem municípios do Rio Grande do Sul – com a
implantação de uma Universidade em área onde já ouvi, como por aqui, “lá nas
grotas”.
Se esta ausência de homenagem já se
alonga no tempo e, ainda não foi percebida por quem devia ter tal gesto de
grandeza, em elevação à simples liturgia que o cargo lhe outorga, por que não;
tal uma iniciativa não brotar em algum poder público das comunidades aonde a
URI já pulsou e panoramas alterou!?
Por isso desejo reforçar: não, nenhum
político, nenhum homem público, nenhuma personalidade, nenhuma instituição
esportiva ou social, nenhuma indústria, nenhum segmento econômico – ressalte-se
em tempo, isoladamente – contribuiu
mais que a URI nestes últimos 28 anos para o desenvolvimento de regiões até
então – relegadas a terceiro plano. Nos meus 21 anos de URI, certa feita,
encontrei 117 municípios que eram diretamente atendidos pela Universidade.
Reconheço que a instituição não é um
brinco ou um diamante. Diria mais – hoje em dia, longe disso. Quem observa,
sabe que a Universidade já foi mais do que é, considerando a conjuntura externa
e, por que não, observando-a a partir das próprias entranhas.
Mas para uma área geográfica que em
meio às próprias dificuldades sempre acalentou potencialidades que ainda
estavam a ser melhor exploradas, a esperança materializada através
de uma Universidade, foi uma obra e tanto – para não dizer a maior de todas em
seu próprio seio. Sim, porque pelo próprio objetivo da instituição, outras
obras se fizeram, e como uma cadeia de serviços, a multiplicação do
desenvolvimento se tornou mais factível.
Se a reposta que hoje a Universidade
dá às suas comunidades está à altura das necessidades das mesmas, ou do que se
sonhou e projetou, difícil confirmar sem equívoco. Na minha honesta observação,
fruto de quem ouve de forma insuspeita e independente como sempre o fiz – não.
O certo é que se um navio ou um avião
não pode desconsiderar a necessidade de uma eventual correção de rota, por
razão imprevisível, circunstancial ou nem tanto assim; os novos ventos que
renovam e refrescam o mundo – devem ser aproveitados para remover eventuais
teias de aranha que insistem em agarrar-se a empreendimentos que não podem
deixar de se renovar sob pena de colocar navios à deriva, ou aviões a planar
até encontrarem seu fim. E isto ninguém de ontem, de hoje ou de amanhã merece,
sem deseja, nas comunidades, que para se fazer em vida, respirando – teve de
contornar montanhas, as mais altas, íngremes, escarpadas e, por vezes;
encobertas por lisas rochas de soberba e de vaidade.
De qualquer sorte, quem tem por fim
moldar massas encefálicas supõe-se dela não sentir falta. Por isso
mesmo é de saudar mais um aniversário da URI, até com uma pitada de otimismo.
Por respeito à inteligência - reverenciar aqueles que a sonharam e a tornaram
realidade. E desejar boa sorte a quem hoje tem a responsabilidade de
conduzi-la. A URI foi concebida não só para ter vida longa. Mas que a vida
longa se dê com qualidade de vida. E em sendo assim, elevem-se todos, às
exigências com altivez, entrega, inteligência e humildade, como o fizeram
aqueles que abriram o caminho desta instituição que mudou o cenário
educacional, econômico e social em diferentes regiões do Estado – unindo-as com
um sentimento de regionalização, entidade única – mas multicampi – e
comunitária. Que este tripé produza novas lideranças nas suas comunidades. Que
é o seu seio. E, preferencialmente, sem rompantes espetaculosos de magia – mas
com a humildade e a determinação dos primeiros e com os pés firmemente
agarrados às suas origens por mais plurais que sejam. Parabéns e boa sorte a
todos.