sexta-feira, 22 de outubro de 2021

Fiz um 69

 



1

Conto ou não conto!

Bah, não devia. 

Ainda mais católico.

Fui educado a evitar essas, essas coisas.

Mas que diacho, se coisas boas, por que não!

Azar.

Vou contar.

Gente, eu fiz um sessenta e nove.

Não fique vermelho.

Não se apavore.

Nem entre em pânico.

Chega eu.

Sei que é um assunto meio árido

– mas olhando o que acontece na nossa cara,

todos os dias;

isso aí, como diríamos no Cine Ideal,

é “café pequeno”.

2

Agora - é uma experiência única.

Única?

Hoje é quase comum.

Para muitos virou coisa normal

ou (de novo),

como diríamos no Cine Luz também,

“cafona”.

3

Quem se atreveu a fazer não esquece mais.

Ah não esquece.

Quando tu chega nessa altura,

tu já nem sabe mais o que está acontecendo.

Fazendo, se mexendo,

são jeitos, trejeitos, enfim...

perdeu a cabeça; ou como direi 

para encurtar

- atirei-me de cabeça.

Que sensação.

Que emoção.

Que coisa tão tresloucada que...

depois da volta ao

normal, nem se acredita que foi capaz 

de atingir

tal insanidade, descer à tamanha 

loucura infernal.

Ou seria uma benção dos céus.

4

Agora – três coisas são certas depois de fazer:

se sai com um sentimento, uma consequência

e uma convicção.

Sentimento de imensa felicidade.

Conseqüência - todo esgualepado.

Convicção – fez a coisa certa na hora certa.

Não fazer àquelas alturas da vida,

é deixar passar o cavalo encilhado.  

5

Olha - não é para qualquer um.

Dói tudo.

Braço, perna, tronco,

o pescoço.

Os braços parecem que querem 

deixar os músculos,

ou pelancas – saltarem para fora.

Conforme os sacrifícios durante a vida

as pernas tremem.

Os pés resvalam.

A cabeça parece que vai explodir

– mas que diabos,

que exploda se for pra explodir.

6

Se cheguei até aqui – agora não tem volta.

E a cordilheira de ossos

no meio das costas?

Nossa Senhora de Fátima – segura até alcançar

meu relaxante muscular.

Ou meu uísque ou cerveja.

Hoje dizem que desce melhor é com

energético, gim/tônica., entre outras

“cositas mas!”.  Não se sente nada.

7

Mas que nada.

A satisfação,

o prazer

e quando se sabe que não se é

único a fazer,

tudo compensa,

tudo alivia o sentimento de culpa.

Abranda vergonhas e invejas.

Diria – sem ser invejoso – mais invejas.

Ihhh - conheço jornalistas que fizeram.

Médico que fez.

Professor.

Professora então, está cheio.

Que Deus e perdoe - mas tem padre, freira,

bispo e diáconos que fizeram. 

Políticos então... 

E olha, todos quietinhos, quietinhos mas

felizes dentre si mesmos cada por seu

sessenta e nove.

8

Se acusado de extrapolar a temática

do politicamente correto, 

sem problema. Aceito.

Chega de mesmices.

Chega de abóboras.

Chega de falar de política.

Escrevo sobre política há 35 anos e

só me incomodei.

Achando que iria ajudar a avançar 

a cidade, o país, a qualidade de vida

- olha só no que deu!

Sempre o mesmo papinho de sempre.

Sempre a mesma conversinha de sempre.

Portanto - chega do mais do mesmo.

Chega, como se diz mesmo agora? – de

negacionismos.

Assumo o meu sessenta e nove até

o último fio de cabelo.

Cabelo – ah – cabelos.

Me honro dele.

Porém, me defendo e aponto que muitos

que aqui estão a ler – também fizeram -

como já disse.

Quantos mais hão de fazer o seu!?

Hein! Hã, Hã, hã... ahahahahh, como diria

o eterno e grande professor 

mestre João Dautartas.

9

Desde já aviso que não pretendo entrar

em conflito com nenhuma crença.

É pecado? Não sei.

Por que então nos deram um corpo?

Por que nos deram viver um tempo?

Por que nos delegaram gozar prazeres!?

Nos ensinam a se cuidar, 

a ter saúde,

a viver as coisas boas da vida e

querem recriminar ato tão,

tão, tão nobre, tão perseguido contando aí

perseguidos e perseguidas...

Ou estou mentindo?

10

Pensando bem no fim vale à pena ter nascido.

Vivido do jeito que deu, e morrer, assim,

digamos – feliz.

Ou melhor: morrer com saúde. 

11

Fazer um sessenta e nove como eu, 

confesso,

sim eu confesso – fiz e daí! 

– é de se trombetear.

Ignorá-lo seria quase sem sentido 

se não tivesse,

assim, amavelmente, 

não 

– amavelmente é pouco;

assim apaixonadamente – 

não,

apaixonadamente também é pouco;

assim, loucamente – 

não, 

loucamente também é pouco;

não condiz com a experiência,

mas assim – delirantememente, 

isso, 

delirantemente

experimentado também o meu sessenta e nove.

12

Poderia eu receber a oportunidade de algo,

mais inebriante,

mais compensador,

mais paradisíaco em plena terra

- a despeito dos desmerecimentos que

semeei?

Prazer em carne e osso e, em mente - não.

Dificilmente haverá algo maior – repito;

em prazer.

Reforço: pelo menos em satisfação de desejos,

aproveitar  lampejos e,

sossegar invejas que possam me cutucar a mente

lamentando os não feitos seria 

um passaporte para a cadeira de um psicanalista.

Então – se der – faça.

Fiz.

13

Como disse, não quero conflitar com crenças.

Agora - e... se formos só espírito

- um desencarnado a vagar sabe-se lá por onde!?

Quantos cascudos me daria, ou darei

pelo sessenta e nove deixado passar, 

como um matungo cansado 

ou em tropel de puros sangue!?

E se não houver nada disso  

– nem mesmo o “Kit Covid,” 

mas só a ciência,

sim – (aqui já não falo só de mim) se,

só a ciência é a certeza a ditar do mais 

alto pedestal 

que não passamos um milímetro do que somos,

ou seja, morreu – adeus tia Chica!

E aí, nosso corpo feio ou bonito,

esbelto ou maltratado, mas tendo como fim

- banquetear bactérias

e vermes;

por certo lamentaríamos irados

não termos deixado nosso sessenta e nove,

assim registrado no currículo.

14

Nove vez fora crenças ou sem crença alguma,

o fato incontestável é que estes,

e agnósticos ou ateus;

um dia chegaremos à termo: podem 

nos beliscar e nada sentiremos.

Podem nos acariciar que nada sentiremos.

Podem nos bater, arrastar, esquartejar

– e nada sentiremos.

15

O que virá depois da passagem comprada

ou feita – se assistiremos tudo “Lá De Cima”,

ou se estivermos a arder no inferno,

ou se constituírmos uma alma a vagar à espera

de uma nova oportunidade (um novo corpinho);

ou se nos somarmos aos milhares

no limbo do purgatório,

ou se federmos no fundo de uma sepultura abandonada

até que os próprios vermes nos rejeitem,

pois, de uma vez por todas,

– resta-nos, conscientemente sim,

uma constatação óbvia. Incontestável: viver a vida.

Pintou a chance de um bom sessenta e nove;

aproveite. Brinde. Agradeça.

Até reze com o terço entre os dedos

- mas faça. Pelo amor de Deus - faça! 

16

Todos buscam

viver o melhor que podem.

Não é assim?

Para alguns nem importam os meios.

Interessam os fins.

São prazeres.

São alegrias.

São felicidades – fugazes ou nem tanto -,

que nos fazem a vida mais apetitosa,

agradável e, e, e... prazerosa.

Pecado ou não – “Carpe diem!”, Santo Deus!

17

Não vivem postando mensagens que

devemos aproveitar a hora,

o minuto, o segundo?

O momento!?

Que ninguém sabe se haverá amanhã!?

Logo, 

não dá para ignorar pratos prediletos

e muito menos, 

jamais, 

recusar pratos

nem tão incorporados assim à nossa rotina.

Feijão e arroz tem todo dia, mas...

um sessenta e nove... olha. 

Quem recusaria?

Eu rezei agradecido.

18

Sim eu fiz o meu.

Não faz tempo.

Uns 30 dias.

Simplesmente inesquecível até porque único.

Foi tudo bem do jeito como ouvia falar

quando adolescente.

Experiência para se levar

e bater no peito como um homem/macaco

– um Tarzan.

19

Mas, por medo de não saber aonde pode ser

meu destino final

 – por via das dúvidas imploro que

não me falte um padre,

porquanto católico.

Sim, porque um sessenta e nove tem seus riscos.

20

Pode até ser de esquerda

- mas sempre padre.

Sou um católico que no alto da vida

resolveu

– pintou a oportunidade e eu já meio

sem saber nem sobre o que escrever,

talvez

meio desgovernado por causa dos

debates em torno

do Covid, da vacina, do fique em casa,

do negacionismo,

da melhor máscara – de máscara

com bichinho....

pois, oportunizou, 

me deu um chilique e acordei.

Enfim, aproveitei e contei.

Não levaria para a última morada (?)

um segredo desse tamanho 

- tão segredo que chega a ser meio 

surreal: muitos, muitos fazem, 

fizeram - mas quase ninguém

torna público. 

Às vezes hackers descobrem e espalham.

21

Se não consegui o máximo 

com o meu sessenta e nove

sempre sonhado

– para o gasto deu.

Ah se deu.

Me doeu tudo, repito.

Tanto que fui parar na Dani,

minha competente fisioterapeuta.

Dolorido – mas feliz.

Realizado.

Agradecido.

A única preocupação que já me tira o sono

é como será um setenta.

Nunca ouvi falar num desses.

Como... seria ou seria fazer um bicho desses!?

Por onde se começa – Santos!

Como se portar?

O que dizer?

Rezar e agradecer?

Como termina?

22

Agora - se a oportunidade aparecer -,

vou descobrir um jeito.

Ahhh vou dar um jeito.

Vou viver esse momento com toda minha

restante intensidade.

Intensidade, no meu caso, sonhei que, que...

“faleceram” ela.

Ando devagar. Não tenho pressa

- diria o Almir.

Pior que nem tem nem manual.

Não deve ser fácil –porém não impossível.

23

Que os Deuses de todas as crenças,

agnósticos e ateus

– me conduzam até essa desconhecida experiência.

Se chegar lá, faço. Já disse. Faço.

Depois do que senti

– não tem como não experenciar um setenta.

Nem que me alcancem as muletas.

Seriam, como direi – muletas com prazer -,

ou “com muito prazer, por favor as muletas”.

24

Daqui a um ano mais ou menos, eu conto.

Quem já fez – sabe, mas não revela.

Sessenta e nove todo mundo fala 

– mas um setenta ninguém diz nada.

Quem não fez

– curioso, como eu; entregaria os anéis para

um saudável e prazeroso setenta.

25

Desconfio, depois da experiência;

que a vontade de ficar por aqui é tanta

- onde a ciência, os anjos e

os Deuses nos conservam -

que entregaria até os dedos para fazer

um noventão.

Modesto, não obstante,

já sou imensamente grato pela oportunidade

com o meu... 69.

Demorou – mas fiz.

Que alegria.

Que felicidade.

Nem me sinto um pecador.

Sinto que aproveitei a chance que Deus 

me deu

de fazer esse corpinho mais ágil 

em mente descansada.

Pensei: já que o vírus não me pegou

(pelo menos até agora),

que venha o tal de sessenta e nove. 

E veio.

Foi como uma paulada. 

Uma paulada boa.

Até ando meio esquecido.

Mas boto na conta do prazer.

26

Há narrativas na praça,

(pra ficar na terminologia

que orienta as ideologias

– especialmente sem ideologia alguma;

ideologias de interesse - assim fica

mais verdadeiro),

que feito um sessenta e nove bem feito

(como se houvesse sessenta e nove mal feito);

- implica no início de eventuais esquecimentos:

onde deixei as chaves,

os óculos, 

a toalha,

o carro,

os documentos,

se fechou a porta,

a janela dos fundos,

se desligou o gás...

Se todas as torneiras estão fechadas.

Se não ficou nenhuma luz acesa...

Os cahorrinhos estão dentro de casa?

Isto seria, e é, o lado ruim do sessenta e nove.

Fechei a porta da garagem?

E a da frente?

Melhor voltar e ver de novo...

O resto – nem se fala.

Como diria o Julio (Brondani)

“é só alegria”.

27

Como seria bom

se pudesse repetir,

o sessenta e nove.

Mas impossível. 

Nem hoje, nem amanhã, nem nunca mais.

Mas que é coisa de levar pro céu,

pro inferno ou lá aonde as almas vagueiam

à espera de um novo corpinho – ah é.

Voltar, quem sabe até para se pagar 

pelo que se fez de errado,

com o tal sessenta e nove.

Só sei que é quase como acertar

numa mega.

Nunca peguei - mas pelo que dizem...


28

Sim – depois dele estou mais leve.

Será por isso que me sinto 

passar no tempo

- quase voando?

29

Opa, opa, opa – pensando melhor –

não, nada está perdido.

E... se fosse invertido!

Do primeiro ao quinto?

Ou na cabeça – melhor ainda!

Então por que não um, um... 

96?

Assim já meio com o pé na cova 

– mas sempre

se mexendo, remexendo...

quase babando, 

nossa – que nojo,

diria alguém.

My God!

30

Ahhhh.... mas pra mim 

seria pedir demais.

Sou um pecador incorrigível.

Não mereço tanto.

E como suportaria?

De onde tiraria forças...

Quem me acudiria na hora...

Se caísse e quebrasse uma perna...

Ou as duas...

Um braço.. ou até a bacia.

Talvez uma fratura de crânio!

Não.

Um 96 não consigo não.

Já ganhei muito nessa vida,

coisa que nem merecia.

O sessenta e nove, por exemplo,

é uma prova.

Quem me conhece sabe.

Já está de muito bom tamanho

para um guaipeca que...

deixe-me ser honesto,

franco e claro: um

guaipeca que nunca,

jamais,

frequentou uma “pet” de respeito.

Que dirá – ser acolhido em uma

“pet” de madame.

Poder fazer um 96

seria algo como morrer mais que feliz e...

acima de tudo, como dizem, com saúde.

Mas, olha o Inter contra o Barcelona: nunca 

se pode desconfiar de

uma "loteria" que ainda está correndo.

A do sessenta e nove peguei.

A de 96, se pegar

só por graça de Deus.

Porém, essa não revelarei.

Por que já no ato

- devo bater as botas. 

Ou melhor

as pantufas.

Se for como algumas crenças 

- creem,

talvez ouça já com o coração 

e o

cérebro 

parados: "Coitado. Bateu com as dez!".

E eu, invisível e resignado, rindo baixinho 

cimentarei: "deu! meu fui. Mas me fui feliz. 

Mais que isso - não tem como."

 

 

 

 

 

 


quarta-feira, 21 de julho de 2021

Pênaltis!


No futebol de hoje, chamado de moderno (pessoalmente não entendo a expressão com sua aplicabilidade prática ao mundo da bola dentro das quatro linhas), temos como novidades treinamentos de todas as sortes (e azares). É marcação por zona, por homem, são sistemas táticos descritos e “explicados” por comentaristas que nem sempre aos meus olhos tão visíveis. Uma das últimas e maiores “novidades” que tentaram pregar por estas bandas foi o tal “jogo posicionado”. Reitero: duvido que alguém possa explicar com clareza que bicho vem a ser isso. Em todo caso – quem fala e alarde e, quando vence – lá sobem os elogios ao tal modelo. São do velho 4 - 2 - 4; 4 - - 3 - 3; 3 - 5 - 2 ou 4 – 4 – 2 que pode virar um 4 – 2 – 4 ou, mais claramente, um 4 – 3 – 3, do que o futebol ainda mais se alimenta.

Mas voltando aos treinamentos sobre “trabalhos específicos”: goleiro saindo jogando dentro da sua própria grande área, pequena área, com o cabeça-de-área, pouco chutão, etc. Até aí – vá lá. Mas com a qualidade que anda solta correndo pelos campos, que perigo! Agora – por que os goleiros não saem mais do gol!? Por que ficam “pregados” sob a goleira”? Por que não se vê mais goleiro firme, quero dizer, fazendo defesas sem rebotes... Por que, de outro azar, se vê goleiros e, em profusão, rebatendo, socando, espalmando como se fossem atletas de vôlei?

Mas há muitas outras coisas sobre o futebol de hoje que abordo amanhã ou depois. Queria fixar uma coisa hoje. A cobrança de pênalti. Quando, em que condições, que tipo de pênalti o goleiro tem chance real de praticar a defesa. Ora, pegue todos os pênaltis defendidos e conclua. São os pênaltis cobrados à meia força, sem força ou até com muita força, mas do seu quadril para baixo. Pênalti à meia altura é dar chance para o azar. Talvez até no chão se não tiver força mais que a normal. A menos, reitero, se o goleiro cair para o canto “errado”.

Os “treinadores” não treinam pênaltis com os batedores? Por que não colocam uma barreira (sem goleiro mesmo) até a altura da cintura do goleiro, obrigando batedor a cobrar em cima. Em cima. De qualquer lado. Até no meio, mais em cima. Ah mais pode subir e sair... Sim, pode, quando não se tem noção de espaço. Que batam 10, 20, 50, 200 pênaltis assim por semana. Da metade do poste para cima. Procure na sua memória quantos pênaltis você viu os maiores goleiros do mundo pegarem quando cobrados acima do se peitoral. Lembrou de algum? As leis da física o impedem. Simples assim. Se fala tanto em novidades e, apesar de muitos exageros sobre supostas mudanças – esta insiste em não mudar. O batedor bater colocado, à meia altura. O goleiro acerta o canto e pronto. Por fim outra obviedade: não adianta treinar goleiro para pegar pênalti. Se a bola vir com meia força, colocada ou forte, mas acima do seu peito – é gol. Mais recentemente parece que só o meia Edenílson do Inter, entendeu esta máxima. Para os mais antigos abro uma exceção: bater à meia altura ou no chão, só se você for um Noronha. Se não – bate em cima. Bate em cima se não quiseres “consagrar” goleiros que adivinham os cantos. Em cima pode bater no poste, no travessão, subir demais e sair – mas goleiro nenhum vai pegar. E treinado à exaustão – não precisa nem botar força. Os goleiros ainda não têm asas. Muito menos “voam para cima”.  

quinta-feira, 15 de julho de 2021

O Ypiranga tem comando técnico

 

Júnior Rocha - Técnico do Tpiranga

Não conheço pessoalmente Júnior Rocha.

As duas vezes que convidei o presidente para o programa Painel na TV Erechim, o técnico Júnior Rocha não pode comparecer.

Nunca falei com ele.

Mas olhando à distância, pela TV, percebe-se à beira do gramado um homem seguro de si, de convicções, atento aos seus comandados, ao jogo, que vislumbra alternativas, e, sobremaneira; tranquilo, talvez ainda em maturação profissional (porque sempre estamos maturando – o que denota que pode e vai crescer ainda mais na profissão que escolheu).

Exceção aos grandes clubes com recursos financeiros, firmei uma convicção que o passado assevera: os times do interior quando se formam e se firmam – tem no seguimento do trabalho e, muito especialmente, na manutenção do grupo um dos seus segredos mais acreditáveis. Começar tudo de novo, quase do zero, é muito difícil de acertar. Leva tempo e demanda além de trabalho - sorte.

Todos concordam que o futebol de antigamente era melhor, etecetera e tal. Mas nesse etecetera e tal há um componente que era da essência daquele futebol melhor, de times mais fortes, mais competitivos. Era o fato singelo, quase imperceptível e muito pouco provável hoje em dia, que eram grupos de jogadores que se formavam e atuavam juntos dois, quatro ou mais de cinco anos. Tomasi, ponteiro direito e depois meio campista histórico do Atlântico, jogou no Aimoré de Toruca e Mengálvio e depois aqui. Só. O “Velho Borges”, pai do Carpegiani e do Borjão, veio do Pradense e vestiu só a camisa do Atlântico. Mugica, não sei de onde veio – mas desde que olho futebol só vi o grande zagueiro/capitão com a camisa verde e amarela.

Atletas vinham da capital ou de outras cidades e aqui (e assim era com as outras cidades e clubes), se conheciam, começavam, cumpriam seus contratos, eram pouco assediados – por outros clubes ou empresários -, e, não raras vezes iniciavam um namoro que acabava em casamento, em casa, família e as raízes de uma  nova vida estavam agarradas e se espalhavam solo adentro. Feito – isso, jogar futebol era sua profissão no time e na cidade que haviam escolhido. Eu sei, eu sei que havia exceções, mas – este era um dos fundamentos para, de muitos anos para cá, dizer e admitir que “o futebol de antigamente era melhor, os times mais fortes, os jogadores mais...”.

Como é hoje em dia nem é preciso ficar explicando. Peguemos o Ypiranga recente. Reinventou-se várias vezes, algumas com mais força, outras nem tanto, mas vai dançando conforme a música, vai remando conforme as águas do mar se formam que se erguem e baixam em ondas que partem de concorrentes, de empresários ou de próprios profissionais do futebol que não conhecem raízes ou outros que adoram aventuras. E tudo isso está perfeitamente dentro do regramento vigente neste mundo da bola.

O Ypiranga tinha um grande goleiro (Carlão) que virou ídolo, saiu, voltou, perdeu a posição e não está mais. Mas conquistou a confiança do torcedor. Mais recentemente perdeu o zagueiro e capitão do time, Reinaldo, o lateral esquerdo Zé Mário, o volante Tarik, o meia-armador Mossoró, o meia-atacante, Caprini, e o atacante (puxador de contra-ataques), Jean Silva. Como se diz: perdeu a espinha dorsal do time.

Pois, nestes tempos bicudos onde o dinheiro escasseia e com a pandemia rareou ainda mais, cada um fez o que considerou melhor para seus interesses, – no caso – os atletas aceitaram propostas financeiras mais vantajosas e foram embora. É assim porque assim é que é.

É claro que o clube erechinense foi ao mercado para tentar repor as perdas. Remontou-se e hoje não apenas não chora nos últimos degraus da escada de classificação a perda da sua espinha dorsal – antes muito confiável -, como, no momento da competição, pode comemorar a liderança. Lidera uma chave com times de tradição, de muita história, de grandes torcidas e por que não, de conquistas. Ouvi muito, olhando os concorrentes, e avaliando as perdas internas: “se não cair já está no lucro!’. E é verdade. Considerando ter de praticamente recomeçar outra vez.

Penso que neste momento o que vem em primeiro lugar para se dizer, é que esta posição não acontece por acaso. Um pouco de sorte aqui, um azar ali – tudo descontado porquanto também é do futebol -, o que me parece bem aceitável, longe de ufanismos erguidos e sustentados em palafitas de ocasião ou apenas emotivas, é que o Ypiranga está outra vez se remontado ou em fase de consolidação, a partir de um trabalho planejado que se sustenta principalmente a partir de uma forte liderança de seu principal comandante – o técnico.

Mas no futebol onde cada detalhe é peça de essência como em uma engrenagem de confiabilidade, o presidente importa, o gerente de futebol e o diretor importam, a comissão técnica, o fisicultor, os médicos, o treinador de goleiros, os auxiliares, o massagista, o roupeiro, enfim, todos os membros de todos os departamentos tem seus pesos.

A “liga” entre o sonho e a realidade... se dá a partir de um grupo de atletas com suas qualidades expressas especialmente dentro do campo, mas também fora dele – tudo muito bem amarrado num alto grau de confiança de todas as partes. Se o "cano" apresentar e não sanar qualquer furinho - pode tudo ir por água abaixo.

A confiança de cada jogador nas suas próprias potencialidades, na confiança em seu companheiro de onze ou de grupo inteiro e que, juntos, podem competir com grandes probabilidades de vitória numa chave onde as equipes rivalizam, se equivalem – pendendo sempre as maiores chances de vitória a quem mais junto estiver e a quem mais acreditar em si, nos comandantes e nos companheiros, estas pequenas/grandes coisas fazem a diferença. A partir disso começa a formar-se o afamado ambiente (sadio ou podre, otimista ou indiferente, vitorioso ou derrotista, azarento/tanto faz ou glorioso) – que geralmente deixa para se apresentar e mostrar sua cara, de pleno, em definitivo - na hora decisiva. Em síntese: todas as horas são importantes. O treino. o pênalti. a calma. A força. A rapidez. A fluidez do jogo. Exige-se profissionalismo. De todos. Não há mais espaço para amadores ou atitudes, posturas ou mentes amadoras. Ganhar ou perder faz parte. Ambos acontecem e se sucedem. Mas, comprometimento, este não pode faltar. Jamais. Sempre preciso entrar em campo com os atletas. 

Estão de parabéns o gerente de futebol Renan Mobarak, o diretor de futebol, Ricardo Argenta, o presidente e o vice, Adilson Stankievicz e José Scussel, demais dirigentes; o preparador físico Alexandre Andreis e demais auxiliares – além é claro o grupo de jogadores que começa a mostrar suas potencialidades e trocar confiança. Mas o nome mais saliente, no meu entender, até este o momento, é o surpreendente comandante técnico – Júnior Rocha.

No que tudo isso vai dar em 2021 para o Ypiranga eu não sei. Ninguém sabe. Mas o Ypiranga tem comando técnico. Isto é inegável e quem observa, sem paixões ou eloquências, vê e enxerga. O Ypiranga já teve grandes treinadores de futebol. Um deles, que aqui não foi nada bem em termos de resultados de campo (mas era um profissional na acepção do termo - sempre sereno e respeitoso), hoje dirige a seleção brasileira. Júnior Rocha, olhando à distância e pesando menos os resultados (importantíssimos), mas mais ainda a postura que me transmite perceber à distância – parece-me carregar virtudes que geralmente acompanham os comandantes de grandes elencos de futebol. Não se destaca pelo sangue nos olhos, pelo grito, pelo descontrole. Ao contrário. Que o Ypiranga possa se beneficiar disso – como já tem sido possível observar. E que o técnico faça do Ypiranga mais um trampolim para uma exitosa carreira em sua vida, exercendo-a com profissionalismo, autoridade, qualificação, dignidade e respeito com todos aqueles envolvidos com o mundo do futebol.     

 

   

 

 

 

quinta-feira, 8 de julho de 2021

O grande presente do professor Julio ao "Chapéu do Rio Grande" (Parte 2)


Muito leite se tem derramado sobre o abandono da região Alto Uruguai. E nem é mentira. Agora – há coisas que podem ser feitas. Uma delas está caindo de maduro há décadas. Unir as regiões Alto Uruguai e Nordeste. Para isso precisa de uma rodovia pavimentada. O governo anuncia que asfaltará sim a ERS 477 que ligará a partir de Centenário o Alto Uruguai com a região nordeste. Mas o que existe nessas regiões! Olhe o estudo que o professor, pesquisador e empresário Julio Cezar Brondani oferece ao conhecimento público, e tire suas próprias conclusões. É, simplesmente um trabalho de grandeza que joga luzes de tal sorte a iluminar todos os porquês da relevância desta união entre as regiões (Norte/Alto Uruguai) e (Nordeste). Observe  pedido do pesquisador: "união e atitude!'. 


























terça-feira, 6 de julho de 2021

O grande presente do professor Julio ao "Chapéu do Rio Grande" (Parte 1)


Julio Brondani

Muito leite se tem derramado sobre o abandono da região Alto Uruguai. E nem é mentira. Agora – há coisas que podem ser feitas. Uma delas está caindo de maduro há décadas. Unir as regiões Alto Uruguai e Nordeste. Para isso precisa de uma rodovia pavimentada. O governo anuncia que asfaltará sim a ERS 477 que ligará a partir de Centenário o Alto Uruguai com a região nordeste. Mas o que existe nessas regiões! Olhe o estudo que o professor, pesquisador e empresário Julio Cezar Brondani oferece ao conhecimento público, e tire suas próprias conclusões. É, simplesmente um trabalho de grandeza que joga luzes de tal sorte a iluminar todos os porquês da relevância desta união entre as regiões (Norte/Alto Uruguai) e (Nordeste). Observe  pedido do pesquisador: "união e atitude!'. 


 

































                                        







          * Em breve daremos continuidade com novas informações neste modelo. 
             O estudo inicia pelo número 9 dando uma panorâmica geral. 



domingo, 4 de julho de 2021

O que é a vida senão um eterno recordar!

 



1

 

Tem feito uns frios (exagero – dias e noites frias, mas no popular era assim que transitava) de renguear cusco.

E olha, uns frios, logo depois de grossas chuvas.

Em cima de terra molhada.

Ainda hoje – quatro ou cinco dias depois 

das chuvas -, ainda hoje se afunda o pé na terra 

que se finge de firme.

Quanto tu vê, tóóófffff, e lá se foi o tênis no barro.

Mas – esses dias entremeados de chuva e frio -, 

me transportam para minha infância.

Eu sei que o mundo caminha pra frente, que é 

pra frente que temos que olhar – mas quem, quem 

se pudesse, não voltaria no tempo para viver de novo 

o que viveu ou mudar o que viveu, claro, 

se pudesse levar junto a cabeça que tem hoje.

O frio - hoje por exemplo, 5 graus, com sensação 

de 3. Na semana de, 3, 4, 2, zero, um grau...

 

2

 

Certa feita o “eterno” Paulo Santana perguntou

em tom de afirmação: 

“O que é a vida senão um eterno recordar!?”.

Ainda hoje está sendo sepultado o Clerí, 

 competente, impecável garçom do Realce Bar, 

do Clube do Comércio

 e do Atlântico. (Faleceu sábado (3) de enfarte). 

Quantas recordações meu amigo – Santo Deus !

 

3

 

Quando a Baixada Rubra era o fim da cidade com 

recato que deixou saudades,

pois, além só havia em destaque

a Legião com suas 200 a 300 casinhas, sua miséria 

e gente trabalhadora e digna,

o presídio e algumas "casas de luz vermelha" 

nas redondezas,

aquele estádio era um templo sagrado.

 

4

 

Lá,

as tardes de domingo daqueles fins de invernos 

e vésperas de primavera,

resgatados para hoje caberiam num quadro.

 5

 Uma tarde daquelas disposta em bela moldura 

– seria peça de magia, beleza e encanto.

 6

 Ainda de manhã havia rezado na São Pedro, 

de joelhos e com os dedos das mãos entrelaçados, 

a cabeça vergada - para que o Atlântico,

o meu Atlântico,

para o Atlântico do meu pai – o ‘seu’ Alberto,

para que... se não ganhasse,

que pelo menos que não perdesse à tarde.

 

7

 

Depois ia direto para o bazar do ‘seu Aldinho’ 

ver a capa dos Roy Rogers, dos Zorro, do Tarzan, 

do 

Kid Colt e 

do Fantasma. Passos apressados me levavam com 

as calças curtas fazendo plaf, plaf, plaf, plaf 

contra o vento até o centro para ver os cartazes 

do Ideal e do Luz.

 

8

 

No de cima – o Ideal - 007 Contra o Satânico 

Dr. No!’. No debaixo, o Luz, ‘A primeira Noite 

de um Homem’. Na banca da Salete homens

 altos deixavam engraxar os sapatos enquanto 

acendiam Belmontes e Hollywwods, um atrás do outro. 

Agora já eram 11 horas. Sim, e... não, não haveria de chover.

 

9

 

Se chovesse, Santo Deus, como o Índio acertaria 

o gol?

E se o Noronha, sempre tão prudente, sempre 

tão cauteloso, sempre tão pisando em, em... ovos, 

sem quebrar a bola, haveria de empurrar o balão 

de couro com segurança, driblando a poça d’água?!

 

10

 

Se chovesse e o Paulinho patinasse sobre a linha, 

e resvalasse e a, a, a maldita atravessasse 

– sem nenhuma licença a linha do meu Atlântico, 

e aí, assim, sem mais nem menos, gol... e, e, e... 

aí sim, fim?

Não... aquelas grossas e negras nuvens

eram puro frio, só podia ser frio, e assim ficaria à tarde.

 

11

 

Ao meio dia os portões da Baixada se fechavam.

Entrar de graça? – só pulando a cerca por detrás 

da Legião, ou, ou... se eu buscasse com o Pedrinho, 

o uniforme do Galo

lá na dona Rosina (obrigado Toninho); ali perto 

do Dal Prá.

 

12

 

Que ironia: a lavadeira da história do Atlântico, 

vista pelas suas camisas, pelos seus calções, pelas 

suas meias e sungas – era vizinha do pai do 

Toninho Dal Prá, uma espécie de pai do Ypiranga.

 

13

 

Nossa! – os calções do Atlântico, brancos, 

branquinhos, engomados e aquele barral no campo. 

Que pecado botar aqueles calções, lamentava de dó!

 

14

 

À noite, aqueles calções alvos como plumas 

e penas dos anjinhos que enfeitam as romarias 

de Fátima estariam vergados, murchos, 

abatidos, surrados, desfigurados - açoitados pela lama.

 

15

 

Mas, mas, mas... se fosse ao menos pelo 1 a

ou pelo 2 a 1 pra nós! – que a dona Rosina lavasse 

os calções com a alegria de sempre durante 

a semana, puxa vida! E não era assim!?

 

16

 

Meio dia e trinta e os vendedores de tudo, sim, 

de tudo – comparado a hoje, nada -, já passavam 

em frente de casa em frente ao Mantovani.

 

17

 

Às duas meia, Jeepes, Simcas, Rurais, Baratas, 

Gordinis, caminhões Alfa Romeo e Mercedez, 

Fucas e Dekavês já iam se encostando, um ao lado 

do outro, um atrás do outro, pela Jerônimo Teixeira 

e na Nelson Ehlers.

 

18

Estranho?! – não havia flanelinhas, nem guardas.

E nem roubos!

 

19

 

Na frente do portão do Atlântico,

meu tio Leonardo,

com seu defeito de nascença em uma das mãos 

que a deixava em forma de quase gancho;

já oferecia lindas laranjas,

e as mais encorpadas, vistosas, carnudas, 

doces e apetitosas bergamotas de Erechim. 

Não, de Erechim era pouco. Da região. 

Não, do Alto Uruguai também era pouco. 

Eram as mais bonitas, as mais, mais encorpadas, 

mais vistosas, mas, mais apetitosas, as mais atraentes, 

as mais doces bergamotas do, do, do... mundo.

Do meu mundo.

 

20

 

Vindas da costa do Uruguai – ali por detrás 

dos morros de Três Arroios, Mariano, Severiano 

e Aratiba, tinham elas o ar, a pose, a presença, 

a atração, 

o deboche da imponência que só as mais lindas 

top-models tem, quando desfilam hoje pelas 

passarelas da globalização.

 

21

 

Para desespero do tio Leonardo,

porém,

as bergamotas tinham um defeito: eram amarelas,

amarelinhas, como a camisa do histórico rival,

o Ypiranga.

E ainda – não bastando serem lindamente 

amarelinhas; vinham enganchadas e se balançando 

num galhinho com folhas verdinhas...

 

22

 

Na frente do portão da Baixada verde-rubra, 

as bergamotonas do tio – amarelinhas com 

decoração esverdeada! Já ali, um Atlanga?!

 

23

 

Os torcedores chegavam.

Os torcedores se precipitavam.

Os torcedores brotavam e se juntavam 

e acumulavam.

 

24

 

Rádios Saturnos sob o braço, e almofada 

vermelhana mão.

Primeiro a fila do ingresso e depois, 

o ajuntamento 

em volta do caminhãozinho do tio. E logo 

os bolsos compridos das calças de tergal 

se enchiam de bergamotas até os joelhos.

 

25

 

A carroceria da caminhãozinho pendia com 

a carga e parecia ser só questão de minutos

 para virar.

 

26

 

As cascas amarelas, amarelonas já pintavam 

o chão úmido, meio barrento pela chuva do sábado 

à noite. Casconas amarelas boiavam sobre a lâmina 

de poças.

Era shélp, shélp, shélp, shélp... afundando todos 

os Vulcabrás no barro, na lama e junto,

afundando cascas e mais cascas, e por ironia, 

a história que hoje me vêm neste inverno.

 

27

 

O ar da Baixada se embriagava daquele cheiro ácido

 e doce sabor das bergamotas amarelas e 

carnudas quando as unhas compridas e meio 

sujas da labuta da semana,

rasgavam a sua casca que saía quase inteira.

 

28

 

Lacrimejavam olhos quando o ácido escapava 

à fúria das unhas, subindo ao ar com seu cheiro 

eterno. Os gomos salientes e firmes, exuberantes 

e apetitosos eram como seios juvenis 

em peitos adolescentes cheios de vida por dar o passo 

seguinte e desfazer a curiosidade e matar 

a sede da ânsia incontida.   

 

29

 

Homens, mulheres e guris agora despencavam 

de todos os lados até a Baixada.

Num vap-vup, as filas do ingresso e das bergamotas,

agora se iam para o pavilhão verde-rubro.

 

30

 

Sumiam os atlantistas de calças frisadas por entre as duas colunas de coqueiros que levavam até 

o pavilhão. Onde foram parar os coqueiros 

plantados a planejamento no "hall" da Baixada? 

Pecado. Ah, quantos pecados!

 

31

 

Havia quem preferisse as longas, as altas, 

as inesquecíveis arquibancadas de madeira 

atrás da goleira sob a sombra 

– no inverno sombra fria - dos pés de Uva-Japão.

 

32

 

Ao redor do alambrado,

O ‘seu Graví’ - com a cestinha de amendoim 

atraía a gurizada e declamava: ‘os amarelo que 

hoje se cuide/

por que a cobra vai fumá/

é trêis a zero pro Atrântico...

eeeeeeeeeee.... não tem nada não/

vai sê um beeeem de saída do Tomasi/

e dois golo do Pinhão!’.

 

33

 

Eeeeeeeaaaaaaaaaahhhhhhhh – respondia a 

galera no entorno do ‘seu Graví’,

atlantino velho,

velho atlantino,

que se lambuzava com o próprio cuspe da sua 

risada

que lhe brotava da boca quase sem dentes

depois,

dos versinhos improvisados.

Era um ídolo dos atlantistas.

 

24

 

Até hoje, suspeito que a cestinha de amendoim 

que o ‘seu Graví’ carregava, era um despiste, 

um enfeite, 

um adereço, um faz de conta, só para andar 

onde 

bem quisesse dentro do estádio, porque,

à minha memória não me lembro do ‘seu Graví’ vendendo 

um copo de amendoim sequer – mas do seu 

‘atlantinismo’ e dos seus versinhos modestos, 

carregados de sentimento pelo clube 

do coração, disso jamais me esqueço, 

como nunca 

me esquecerei.

 

35

 

Quando a bola rolava,

lá pelas 3 e meia e o Chiochetta parecia pegar fogo

num vermelhão mais vermelho que a camisa 

do Atlântico – após esfregar as mãos fazendo 

“pegar fogo o pavilhão”,

era como se a vida tivesse parado lá fora: o "hall"

da Baixada - a entrada entre-coqueiros - 

era um deserto só – apesar do 

dia cinzento, enlameado, frio e com cheiro 

de bergamota 

inundando o ar.

 

36

 

As bergamotas sobradas descansavam sobre a 

carroceria da caminhãozinho do tio Leonardo.

Pergunto-me ..... anos depois: quem cuidava 

das sobras, se o tio e eu 

também estávamos no alambrado? 

Ou, será que de vez em quando 

se olhava se a carga ainda estava intocável 

– e sempre estava -, e... !?

 

37

 

...e ‘Avante/

vamos para a luta...’.

Que frio era aquele que lambia minhas tripas 

e as minhas orelhas nos segundos tempos,

quando o sol já não tinha mais forças para 

varar os galhos úmidos e a folhas amareladas 

dos incontáveis pés de Uva-Japão,

lá atrás da goleira ‘de cima’ que dava 

para as bochas?

 

38

 

E o Lau – lembram?

O Lau que caminhava de um lado para o outro atrás 

da goleira do Miguel, do Paulinho, 

do Poppy, do Valdir...

de quem quer que estivesse na guarda do gol 

do Atlântico, caminhava sem parar entre os dois 

apitos, 

o inicial e o final!

 

39

 

E quando ao final dos 90 e tantos

com o sol já caindo por detrás do pavilhão das 

bochas e de bolão,

e a segunda-feira já acenando na domingueira 

em despedida,

mil, ou dois mil, ou três mil se levantavam 

na Baixada,

e, eufóricos ou resignados se iam,

amassando as cascas amarelas e barrentas,

das mais belas bergamotas daqueles invernos 

dos anos 1960.

 

 40

 

Seria só o fim de uma tarde de fim de inverno 

– ou apenas mais um capítulo de uma história, 

que como a história, não vai embora e fica.

Quanto tempo o Dartagnan e o Ceni levariam 

para recolher aqueles quilômetros de fios, 

agora molhados e embarrados!?

‘Na vitória

ou na derrota/

honremos nossa tradição...’

 

41

 

Almofadas esquecidas ficavam como testemunhas 

ao relento

como que a conferir as razões do desastre 

da derrota,

ou para rever de onde mesmo,

de onde foi,

afinal de contas

- que o Pinhão empurrara para o fundo das redes,

aos 43 do 2º tempo,

o tento da vitória,

bem como o ‘seu Graví’ prenunciara!

 

42

 

‘Atlântico,

tu és poderoso/

conquistando vitórias com ardor

teu símbolo é belo

e grandioso

inspira confiança e amor’

 

43

 

E quando o domingo se fechava de vez,

todos os Gordinis, Dekavês, Rurais, 

Baratas e caminhões já se tinham ido embora.

 

44

 

Uns para os bares da redondeza, outros para 

o aconhego dos lares, outros mais – deslizavam 

uma quadra para festejar a vitória, ali

pelas redondezas em algumas 

"casas de luz vermelha"; 

que assim, aos ouvidos de hoje, 

soa como velho santuário de mulheres que 

compreendiam as necessidades dos homens, 

e lhes ajudavam a ser mais felizes. E tudo, 

sem grandes explorações – umas Serramaltes 

bastavam para a volta olímpica num quartinho 

onde a bacia da higiene, dormia quieta num 

cantinho, sob luz vermelha (tinha que ser vermelha) 

e o Vicente Celestino a rodar: “Tornei-me um ébrio 

e na bebida busco esquecer/

Aquela ingrata que eu amava e

que me abandonou/Apedrejado pelas 

ruas vivo a sofrer

/Não tenho lar e nem parentes, tudo terminou...”.

 

45

 

Hoje em dia não tem mais Baixada Rubra.

A Legião emigrou para a Florestinha e fez nascer 

o embrião do Progresso – o Cachorro Sentado.

Jogadores, dirigentes e torcedores 

se dispersaram. Foram embora. Morreram 

ou se extraviaram pelo mundo. Pela vida!

Ainda outro dia, deparei-me com a sepultura do 

Ceni lá no Jardim da Saudade.

 

46

 

Os carros daqueles tempos morreram.

O Atlântico morreu.

Até as bergamotas trocaram de cor.

Agora elas são doces, porém, não são mais 

todas, amarelas. Variam. Agora elas vêm mais 

cedo – e muitas delas ficam o ano todo – agora, 

pintadas de verde – embora, ainda guardem 

um corpo esbelto, com casca de presença.

47

Só ficaram lá onde era o campo do Atlântico,

num olhar de memória,

a escuridão,

o ar gelado,

algumas árvoes,

as bochas – meio esquecidas,

e talvez os fantasmas do ‘seu Graví’, do meu 

tio Leonardo, do Índio e do Lau;

lá ficou o jeito e a cara da segunda batendo no fim 

do domingo,

e o cheiro ácido

com sabor doce,

das eternas bergamotas de julho.

Pra parede não ficar nua – colocaram

um quadro de um parque poliesportivo

que atende às exigências de hoje 

- tudo bem diferente.

48

A vida passa.

E cada um vive a sua no seu tempo.

E, sejamos honestos, dentro das suas circunstâncias 

que viram lembranças.

E esta que aqui deito – é uma delas.

Se os que hoje nadam, jogam tênis ou futsal

naquele templo;

de minha sorte me aqueço com a recordação

viva e quente daqueles dias chuvosos e gelados.

As bergamotas do tio Leonardo na Baixada Rubra 

– me confortam quando a ameaça pelo tempo que 

se foi me persegue e até me castiga.

“O que a vida senão um eterno recordar!?”.