1
Conto ou não
conto!
Bah, não devia.
Ainda mais católico.
Fui educado
a evitar essas, essas coisas.
Mas que diacho,
se coisas boas, por que não!
Azar.
Vou contar.
Gente, eu
fiz um sessenta e nove.
Não fique
vermelho.
Não se
apavore.
Nem entre em
pânico.
Chega eu.
Sei que é um
assunto meio árido
– mas
olhando o que acontece na nossa cara,
todos os
dias;
isso aí,
como diríamos no Cine Ideal,
é “café
pequeno”.
2
Agora - é uma experiência única.
Única?
Hoje é quase
comum.
Para muitos
virou coisa normal
ou (de novo),
como
diríamos no Cine Luz também,
“cafona”.
3
Quem se atreveu a fazer não esquece mais.
Ah não
esquece.
Quando tu
chega nessa altura,
tu já nem sabe
mais o que está acontecendo.
Fazendo, se
mexendo,
são jeitos,
trejeitos, enfim...
perdeu a cabeça; ou como direi
para encurtar
- atirei-me
de cabeça.
Que
sensação.
Que emoção.
Que coisa
tão tresloucada que...
depois da
volta ao
normal, nem se acredita que foi capaz
de atingir
tal insanidade, descer à tamanha
loucura infernal.
Ou seria uma
benção dos céus.
4
Agora – três coisas são certas depois de fazer:
se sai com um
sentimento, uma consequência
e uma
convicção.
Sentimento de
imensa felicidade.
Conseqüência
- todo esgualepado.
Convicção –
fez a coisa certa na hora certa.
Não fazer
àquelas alturas da vida,
é deixar
passar o cavalo encilhado.
5
Olha - não é para qualquer um.
Dói tudo.
Braço,
perna, tronco,
o pescoço.
Os braços parecem que querem
deixar os músculos,
ou pelancas
– saltarem para fora.
Conforme os
sacrifícios durante a vida
as pernas
tremem.
Os pés
resvalam.
A cabeça
parece que vai explodir
– mas que
diabos,
que exploda
se for pra explodir.
6
Se cheguei até aqui – agora não tem volta.
E a
cordilheira de ossos
no meio das
costas?
Nossa
Senhora de Fátima – segura até alcançar
meu
relaxante muscular.
Ou meu
uísque ou cerveja.
Hoje dizem
que desce melhor é com
energético,
gim/tônica., entre outras
“cositas mas!”. Não se sente nada.
7
Mas que
nada.
A
satisfação,
o prazer
e quando se sabe
que não se é
único a
fazer,
tudo compensa,
tudo alivia
o sentimento de culpa.
Abranda
vergonhas e invejas.
Diria – sem
ser invejoso – mais invejas.
Ihhh - conheço jornalistas que fizeram.
Médico que fez.
Professor.
Professora então, está cheio.
Que Deus e perdoe - mas tem padre, freira,
bispo e diáconos que fizeram.
Políticos então...
E olha, todos quietinhos, quietinhos mas
felizes dentre si mesmos cada por seu
sessenta e nove.
8
Se acusado de extrapolar a temática
do politicamente correto,
sem problema. Aceito.
Chega de
mesmices.
Chega de
abóboras.
Chega de falar de política.
Escrevo sobre política há 35 anos e
só me incomodei.
Achando que iria ajudar a avançar
a cidade, o país, a qualidade de vida
- olha só no que deu!
Sempre o mesmo papinho de sempre.
Sempre a mesma conversinha de sempre.
Portanto - chega do mais do mesmo.
Chega,
como se diz mesmo agora? – de
negacionismos.
Assumo o meu
sessenta e nove até
o último fio
de cabelo.
Cabelo – ah
– cabelos.
Me honro
dele.
Porém, me
defendo e aponto que muitos
que aqui estão a ler – também fizeram -
como já disse.
Quantos mais
hão de fazer o seu!?
Hein! Hã,
Hã, hã... ahahahahh, como diria
o eterno e grande professor
mestre João Dautartas.
9
Desde já aviso que não pretendo entrar
em conflito
com nenhuma crença.
É pecado?
Não sei.
Por que
então nos deram um corpo?
Por que nos
deram viver um tempo?
Por que nos
delegaram gozar prazeres!?
Nos ensinam a se cuidar,
a ter saúde,
a viver as
coisas boas da vida e
querem
recriminar ato tão,
tão, tão
nobre, tão perseguido contando aí
perseguidos
e perseguidas...
Ou estou
mentindo?
10
Pensando bem no fim vale à pena ter nascido.
Vivido do
jeito que deu, e morrer, assim,
digamos – feliz.
Ou melhor: morrer com saúde.
11
Fazer um sessenta e nove como eu,
confesso,
sim eu confesso – fiz e daí!
– é de se trombetear.
Ignorá-lo seria quase sem sentido
se não tivesse,
assim, amavelmente,
não
– amavelmente é pouco;
assim apaixonadamente –
não,
apaixonadamente
também é pouco;
assim, loucamente –
não,
loucamente também é pouco;
não condiz
com a experiência,
mas assim – delirantememente,
isso,
delirantemente
experimentado
também o meu sessenta e nove.
12
Poderia eu receber a oportunidade de algo,
mais inebriante,
mais
compensador,
mais
paradisíaco em plena terra
- a despeito
dos desmerecimentos que
semeei?
Prazer em
carne e osso e, em mente - não.
Dificilmente
haverá algo maior – repito;
em prazer.
Reforço:
pelo menos em satisfação de desejos,
aproveitar lampejos e,
sossegar
invejas que possam me cutucar a mente
lamentando
os não feitos seria
um passaporte para a cadeira de um psicanalista.
Então – se
der – faça.
Fiz.
13
Como disse,
não quero conflitar com crenças.
Agora - e... se
formos só espírito
- um
desencarnado a vagar sabe-se lá por onde!?
Quantos
cascudos me daria, ou darei
pelo sessenta e nove deixado passar,
como um matungo cansado
ou em tropel de puros sangue!?
E se não
houver nada disso
– nem mesmo o “Kit Covid,”
mas só a ciência,
sim – (aqui
já não falo só de mim) se,
só a ciência é a certeza a ditar do mais
alto pedestal
que não passamos um milímetro do que somos,
ou seja,
morreu – adeus tia Chica!
E aí, nosso
corpo feio ou bonito,
esbelto ou
maltratado, mas tendo como fim
- banquetear
bactérias
e vermes;
por certo
lamentaríamos irados
não termos deixado nosso sessenta e nove,
assim registrado no currículo.
14
Nove vez fora crenças ou sem crença alguma,
o fato
incontestável é que estes,
e agnósticos
ou ateus;
um dia chegaremos à termo: podem
nos beliscar e nada sentiremos.
Podem nos
acariciar que nada sentiremos.
Podem nos
bater, arrastar, esquartejar
– e nada
sentiremos.
15
O que virá depois da passagem comprada
ou feita –
se assistiremos tudo “Lá De Cima”,
ou se
estivermos a arder no inferno,
ou se
constituírmos uma alma a vagar à espera
de uma nova
oportunidade (um novo corpinho);
ou se nos
somarmos aos milhares
no limbo do
purgatório,
ou se federmos
no fundo de uma sepultura abandonada
até que os
próprios vermes nos rejeitem,
pois, de uma
vez por todas,
– resta-nos,
conscientemente sim,
uma constatação óbvia. Incontestável: viver a vida.
Pintou a chance de um bom sessenta e nove;
aproveite. Brinde. Agradeça.
Até reze com o terço entre os dedos
- mas faça. Pelo amor de Deus - faça!
16
Todos buscam
viver o
melhor que podem.
Não é assim?
Para alguns
nem importam os meios.
Interessam
os fins.
São
prazeres.
São
alegrias.
São
felicidades – fugazes ou nem tanto -,
que nos
fazem a vida mais apetitosa,
agradável e, e, e... prazerosa.
Pecado ou
não – “Carpe diem!”, Santo Deus!
17
Não vivem postando mensagens que
devemos
aproveitar a hora,
o minuto, o
segundo?
O momento!?
Que ninguém
sabe se haverá amanhã!?
Logo,
não dá
para ignorar pratos prediletos
e muito menos,
jamais,
recusar pratos
nem tão
incorporados assim à nossa rotina.
Feijão e
arroz tem todo dia, mas...
um sessenta e nove... olha.
Quem recusaria?
Eu rezei
agradecido.
18
Sim eu fiz o meu.
Não faz
tempo.
Uns 30 dias.
Simplesmente
inesquecível até porque único.
Foi tudo bem
do jeito como ouvia falar
quando
adolescente.
Experiência
para se levar
e bater no
peito como um homem/macaco
– um Tarzan.
19
Mas, por medo de não saber aonde pode ser
meu destino
final
– por via das dúvidas imploro que
não me falte
um padre,
porquanto
católico.
Sim, porque um sessenta e nove tem seus riscos.
20
Pode até ser de esquerda
- mas sempre
padre.
Sou um
católico que no alto da vida
resolveu
– pintou a
oportunidade e eu já meio
sem saber
nem sobre o que escrever,
talvez
meio desgovernado
por causa dos
debates em
torno
do Covid, da
vacina, do fique em casa,
do
negacionismo,
da melhor
máscara – de máscara
com
bichinho....
pois, oportunizou,
me deu um
chilique e acordei.
Enfim, aproveitei
e contei.
Não levaria para a última morada (?)
um segredo desse tamanho
- tão segredo que chega a ser meio
surreal: muitos, muitos fazem,
fizeram - mas quase ninguém
torna público.
Às vezes hackers descobrem e espalham.
21
Se não consegui o máximo
com o meu sessenta e nove
sempre sonhado
– para o
gasto deu.
Ah se deu.
Me doeu tudo,
repito.
Tanto que fui
parar na Dani,
minha
competente fisioterapeuta.
Dolorido –
mas feliz.
Realizado.
Agradecido.
A única
preocupação que já me tira o sono
é como será um setenta.
Nunca ouvi
falar num desses.
Como... seria
ou seria fazer um bicho desses!?
Por onde se
começa – Santos!
Como se
portar?
O que dizer?
Rezar e
agradecer?
Como
termina?
22
Agora - se a oportunidade aparecer -,
vou
descobrir um jeito.
Ahhh vou dar um
jeito.
Vou viver
esse momento com toda minha
restante
intensidade.
Intensidade,
no meu caso, sonhei que, que...
“faleceram”
ela.
Ando devagar. Não tenho pressa
- diria o Almir.
Pior que nem tem nem
manual.
Não deve ser
fácil –porém não impossível.
23
Que os Deuses de todas as crenças,
agnósticos e
ateus
– me
conduzam até essa desconhecida experiência.
Se chegar
lá, faço. Já disse. Faço.
Depois do
que senti
– não tem
como não experenciar um setenta.
Nem que me alcancem as muletas.
Seriam, como
direi – muletas com prazer -,
ou “com muito
prazer, por favor as muletas”.
24
Daqui a um ano mais ou menos, eu conto.
Quem já fez
– sabe, mas não revela.
Sessenta e nove todo mundo fala
– mas um setenta ninguém diz nada.
Quem não fez
– curioso, como
eu; entregaria os anéis para
um saudável e
prazeroso setenta.
25
Desconfio, depois da experiência;
que a
vontade de ficar por aqui é tanta
- onde a
ciência, os anjos e
os Deuses
nos conservam -
que entregaria
até os dedos para fazer
um noventão.
Modesto, não
obstante,
já sou
imensamente grato pela oportunidade
com o meu... 69.
Demorou –
mas fiz.
Que alegria.
Que
felicidade.
Nem me sinto
um pecador.
Sinto que aproveitei a chance que Deus
me deu
de fazer esse corpinho mais ágil
em mente descansada.
Pensei: já
que o vírus não me pegou
(pelo menos
até agora),
que venha o tal de sessenta e nove.
E veio.
Foi como uma paulada.
Uma paulada boa.
Até ando meio
esquecido.
Mas boto na conta do prazer.
26
Há narrativas na praça,
(pra ficar
na terminologia
que orienta
as ideologias
–
especialmente sem ideologia alguma;
ideologias de
interesse - assim fica
mais
verdadeiro),
que feito um sessenta e nove bem feito
(como se houvesse sessenta e nove mal feito);
- implica no início de eventuais esquecimentos:
onde deixei as chaves,
os óculos,
a
toalha,
o carro,
os
documentos,
se fechou a
porta,
a janela dos
fundos,
se desligou o gás...
Se todas as
torneiras estão fechadas.
Se não ficou nenhuma luz acesa...
Os cahorrinhos estão dentro de casa?
Isto seria,
e é, o lado ruim do sessenta e nove.
Fechei a porta da garagem?
E a da frente?
Melhor voltar e ver de novo...
O resto – nem
se fala.
Como diria o
Julio (Brondani)
“é só
alegria”.
27
Como seria bom
se pudesse repetir,
o
sessenta e nove.
Mas impossível.
Nem hoje, nem amanhã, nem nunca mais.
Mas que é
coisa de levar pro céu,
pro inferno
ou lá aonde as almas vagueiam
à espera de
um novo corpinho – ah é.
Voltar, quem sabe até para se pagar
pelo que se fez de errado,
com o tal
sessenta e nove.
Só sei que é
quase como acertar
numa mega.
Nunca peguei - mas pelo que dizem...
28
Sim – depois dele estou mais leve.
Será por isso que me sinto
passar no tempo
- quase voando?
29
Opa, opa,
opa – pensando melhor –
não, nada
está perdido.
E... se
fosse invertido!
Do primeiro
ao quinto?
Ou na cabeça
– melhor ainda!
Então por que não um, um...
96?
Assim já meio com o pé na cova
– mas sempre
se mexendo,
remexendo...
quase babando,
nossa – que nojo,
diria
alguém.
My God!
30
Ahhhh.... mas pra mim
seria pedir demais.
Sou um
pecador incorrigível.
Não mereço
tanto.
E como
suportaria?
De onde
tiraria forças...
Quem me
acudiria na hora...
Se caísse e
quebrasse uma perna...
Ou as duas...
Um braço.. ou até a bacia.
Talvez uma fratura de crânio!
Não.
Um 96 não consigo não.
Já ganhei muito nessa vida,
coisa que
nem merecia.
O sessenta e
nove, por exemplo,
é uma prova.
Quem me
conhece sabe.
Já está de
muito bom tamanho
para um
guaipeca que...
deixe-me ser
honesto,
franco e
claro: um
guaipeca que
nunca,
jamais,
frequentou uma
“pet” de respeito.
Que dirá –
ser acolhido em uma
“pet” de
madame.
Poder fazer
um 96
seria algo
como morrer mais que feliz e...
acima de tudo, como dizem, com saúde.
Mas, olha o Inter contra o Barcelona: nunca
se
pode desconfiar de
uma "loteria" que ainda está correndo.
A do
sessenta e nove peguei.
A de 96, se pegar
só por graça de Deus.
Porém, essa não revelarei.
Por que já no ato
- devo bater as botas.
Ou melhor
as pantufas.
Se for como algumas crenças
- creem,
talvez ouça já com o coração
e o
cérebro
parados: "Coitado. Bateu com as dez!".
E eu, invisível e resignado, rindo baixinho
cimentarei: "deu! meu fui. Mas me fui feliz.
Mais que isso - não tem como."