Foto Caio Almeida/Arquivo pessoal |
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“Meu caro José Adelar (Ody). Deixe-me saudá-lo como sempre
fazia quando nos encontrávamos à tarde no Mozart (Lago). A propósito dê um abraço
nele, no seu Geórgio e demais amigos que apareciam pra bater papo. José
Adelar! – ninguém deseja despedir-se daí, mas o fato é que “Aqui em Cima” temos
centenas, milhares de amigos e conhecidos. Há dois meses deu um alvoroço aqui.
Acabara de chegar o Maradona. Logo depois o Paolo Rossi. Tu vê – dois carrascos
que tiraram o Brasil de duas Copas. A convicção que começo a formar, depois de
quase 120 dias “Aqui Em Cima”, é que esse negócio de “Outro Lado” mereceria um
estudo aprofundado “aí embaixo”. Quando comparo como são as coisas “Aqui”, não
duvido mais: penso que o “outro lado pode ser aí” e o lado certo - “Aqui”.
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Olha José Adelar, fui recepcionado pelo Serginho (Intkar), excelente
músico dos Crazy Boys, nosso amigo em comum dos encontros na sala do Mozart. Serginho Intkar que ironicamente falecera em 22 de fevereiro de 2019. Ele
me conduziu ao bairro Erechim, 99700000 onde hoje resido. Aliás, qual não foi
minha surpresa ao abrir a porta um dia desses e deparar-me com meu pai! E
depois com o Fritz (meu cachorro)! Estamos remontando a família – mas, por
favor, não significa que se apressem. Antes de cada um cumprir sua missão aí,
nada de “Subir”.
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José Adelar. Que dia foi segunda-feira agora, essa que
passou!? Isso. 22. Exatamente um ano daquele 22 de fevereiro lá na Brava. Um sol de rachar. Dez
ou dez e meia da manhã – vou fazer nome até por que na vida são detalhezinhos que
não passam disso, considerando nossa passagem passageira, fugaz, por aí. Além
do mais tudo meio por acaso: tu e a Sonia, o Cláudio e a Cleo, o Cleber e a
Odete, o Caio e a Tiani. A propósito... deixemos assim... Que tudo se resolva
pelo melhor, é a minha torcida. Mas como fomos nos encontrar daquele jeito!? Penso
que todos do Lions deviam estar naqueles dias, “esparramados” num canto de
praia! O Gilmar e Leila – pelo que lembro andavam suando frio em dia de 37 graus, apreensivos com o retorno da filha que vinha do México, sim porque já se
falava então, numa tal de pandemia. Mas – voltando ao “nosso” sábado de 2020. Era
cerveja pra cá, aperol e água pra lá, amendoim, azeitona... e outros que tais,
e nós todos sob três guarda-sóis e uma conversa sem rumo, sem compromisso e sem
fim. Não via a hora do fim da tarde – porque naquela noite eu iria fazer o que
sempre gostei: preparar o jantar.
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Antes, atente, quero fazer uma observação que poucos notaram:
houve um momento em que alguém pertinho de nós falou sobre um vírus que já
tinha saído da China e chegava à Europa. Quando adicionaram ao termo, pandemia,
ouvi você comentar baixinho, mas eu peguei: “por mim já podíamos saltar direto
pra 2021”. Fiquei pensando, mas logo tudo foi esquecido. Lá pelas cinco da
tarde levantamos acampamento. Me botei na cozinha e fiz o melhor que pude. A
geladeira ia aliviando e, quando ficaram sabendo que o Grêmio perdera o
primeiro turno do Gauchão para o Caxias, aí é que tu e o Cláudio levantaram mais ainda as taças.
Chegaram a comprar na praia porta-lata pra cerveja só por que tinha a marca
“Inter”. Eu lembro. Eu lembro bem! Pelo que comemos naquela noite - a massa com
dois tipos de molho, o frango e a carne assada ficaram no capricho. A salada
mista então – nem se fala!
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José Adelar! Que encontro inesquecível. E que conversa! Eu,
até quebrei meu protocolo de ouvir mais que falar, e contei uma passagem (peço
reservas), até porque já não importa mais. Antes que suspeitem sobre alguma
quebra de ética no cartório, desistam. Era sobre minha vida pessoal e só. Mas, José
Adelar - fiquei até certo ponto aliviado em dividir aquela passagem da minha
juventude lá em Santo Ângelo e, hoje, posso confessar, que aquele sábado, 22 de
fevereiro, até a despedida do pessoal de volta à Meia Praia, lá pelas duas da
matina - foi um dos momentos alegres da minha vida. Não preciso fazer reservas.
Já tenho idade e idoneidade para dizer que, eu e a Lenir, ficamos emocionados
de alegria naquele dia/noite.
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E o que dizer da maré em Meia Praia? “Gente... olha a água...
shuááááááááá. Segurem as bolsas, as caixas, os chinelos, as mochilas de pano, os celulares, os prendedor de cabelo, os bonés.
Peguem as latinhas, as latinhas de cerveja pelo amor de Deus”! Recuava e logo
shuááááááááááááá. E nós cada vez mais pra trás e pra trás e pra trás. Chegou um
momento onde eu estava sentado na cadeira e, a cadeira, atolada no fundo da
areia. Já não sabia mais o que era cadeira ou areia. E era shuáááá e shuááááá. Que
dia! E o jantar naquele restaurante! Eu e a Lenir de frente pra Sonia. O Cláudio,
a Cleo, o Kleber, a Odete e a Tiani. Nas duas pontas da mesa – tu e o Caio.
Depois retornamos, nos arrastando, de satisfeitos pela praia. E o Uber – “cadê
o Uber!?”. Eu vi que tu percebeu. Fiquei meio impaciente com a demora do táxi
ou do Uber. No fim – apareceu um Uber e fechamos mais um encontro.
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Lembrança prazerosa. E o churrasco do Caio no dia seguinte então!?
E aquele barzinho de degustação com marcas de chopp do mundo inteiro... Por
mim, quero dizer, que foi uma experiência muito agradável. Sou grato pela
oportunidade que tive de passar com vocês, por acaso; aqueles dias, que recordo hoje,
fechando um ano. Penso que ninguém discorda.
Como esquecer as piadas limpinhas – uma mais limpa que a outra - do Kleber? Ahaahahahah.
Como diria o poeta do Alegrete, Mario Quintana: “A amizade é um amor que nunca
morre”.
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José Adelar! Pede à Sonia abraçar todos os membros do Lions
Erechim Cinquentenário, sem exceção – todos; pelos momentos que passamos, quer
seja em tarefas de arrecadação nos mercados, no varal solidário, no preparo do
frango assado, no baile da sobremesa e nas reuniões. Agradeça a todos os amigos
ou até mesmo conhecidos, que pediram pela minha recuperação. Eu ouvia tudo o que
a Lenir me levava no hospital: as mensagens de força e orações, enfim, e que
pena que a tua analogia da pinguela sobre o rio Dourado, que tanto medo e
pânico te causou na infância, não tenha resistido para mim como resistiu para
você. Mas acredite, ajudou. Aqui de novo, reabilito a convicção que começo a
formar: é muito provável que o caminho de cada um já tenha um destino, a
despeito de alguns, não raras vezes, contribuírem de forma decisiva para
antecipá-lo.
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Eu... lutei com o que pude. Sou sempre grato à Lenir, que não
só me confortou e aliviou a dor no hospital, como foi a companheira perfeita
durante toda minha vida, como posso dizer, “aí do outro lado”. Também agradeço
de coração a presença do Conrado e da Carol, a quem peço que levem adiante suas
vidas e não esmoreçam diante dos desafios. Deixo ainda minha gratidão e um
abraço fraternal aos dedicados funcionários do Cartório, aos queridos amigos de
pescaria e aos membros da Igreja.
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“Aqui Em Cima” temos regras e liberdade, José Adelar. A
consciência, que se faltou para alguns, foi restabelecida “Aqui”, de sorte que
não há pendengas políticas, econômicas e sociais. Vivemos como irmãos. Todas as
semanas temos jantares ou pescarias. Continuo com meu hábito de ler. Encontrei
inúmeros amigos teus especialmente da área jornalística, como o Idylio, o Tramontini
e, o inconfundível Geder, além de quase todos os Carraros. Quem te manda um
abraço especial, é a dona Maria Amorim Smaniotto. Ela te tem como um filho.
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Meu caro José Adelar. Aliás, foi assim que te saudei na noite
do teu aniversário, ano retrasado, quando fomos aí e te dei um vinho. Descobri –
porque “Daqui De Cima” a gente vê tudo e nada nos escapa -, que a garrafa ainda
está fechada. Isso não se faz. Chama o Cláudio e “mete o saca-rolha”. Enfim, os
lamentos que ainda se dão aí, são de tradição histórica. São assim mesmo e por
isso, naturais e, com o tempo... até aceitáveis, mesmo porque outra saída não
há. Ninguém deseja partir e ninguém deseja perder alguém querido. Sei que tive
meus equívocos. Nunca me arvorei perfeição. Mas também sei que cativei e
cultivei uma imagem de uma pessoa boa, honesta, sensível e agradável e, isto,
agora com a minha “troca de lado”, me enche mais ainda de alegria. Creia José
Adelar - é um conforto pessoal.
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Se querem fazer mais por mim – peço que todos se acalmem. Mantenham
suas rotinas. Quero ser apenas uma boa lembrança no coração e na memória dos
meus familiares e dos meus amigos. Que o meu vizinho e amigão, Cláudio, não se
esqueça da última mensagem que mandei pra ele. Citei ela há pouco.
No mais, mando este e-mail, porque você estava por escrever, e estava e estava,
mas, eu sei, eu via que não conseguias. Por isso tomei, eu mesmo, a iniciativa
aproveitando aquela data de 22 de fevereiro de 2020.
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Por favor, não fiquem chateados e nem me critiquem por estar
“mexendo na ferida da partida”. Que nada. O sentimento da “perda” sempre
permanecerá. Só lamento a falta de oportunidade de me despedir. Mas - o tempo
vai ajudar. O tempo é o segredo de tudo. Porém, eu precisava, entendam, por
favor... eu precisava dar um “Auf Wiedersehen”, um “adeus” no sentido de um
“até logo” em português. Me sinto melhor assim. Sigam com suas vidas por aí.
Fiquem juntos. E riam mais do que se lamentem. Um dia, estaremos todos aqui, ao
que me parece, do “Lado Certo”. E eu estarei à espera de cada um com a
discrição e a alegria de sempre.
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Por fim – confesso com voz bem baixinha: eu sei, tenho
certeza, que estou bem pertinho de cada um de vocês. No coração de cada um de vocês. Fechem os olhos e pensem
em mim. É como se estivéssemos, neste momento, apenas em lugares diferentes. Mantenham
suas ações de Lions, seus encontros festivos e brindem à vida. Espiritualmente
estamos juntos como sempre estivemos e, isto, ninguém poderá desfazer. E se
alguma coisa pode confortá-los, creiam, tive uma vida boa e vocês fazem parte
dela. Ser útil e feliz. Fazer outros felizes. E isto, com a humildade e a
discrição que sempre me caracterizaram - sei que consegui ser e fazer. Reitero o
que já pedi acima: não fiquem tristes por eu relembrar um pedacinho da minha
vida “aí embaixo”. Este contato me faz bem. Sinto-me ainda mais próximo de
vocês. ‘Bis eines Tages’ – (Até um dia).
Abraços.
Saudades Eternas,
Timm (Valdir Airton)”.