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Lucia, Vanda, Enori, Helena, Francisco, Neusa, Joemir e Neivo. (Foto:AEL) |
No
lançamento da 24ª Feira do Livro na Câmara de Vereadores, sexta-feira, 24,
inúmeros
pronunciamentos foram realizados, entre os quais o do homenageado
desta feira, Francisco
Basso Dias (Chico) locutor da rádio Difusão.
Entre as manifestações da Patrona da Feira, Joemir
Rossett, da secretária de Cultura e
Esportes, Carla Talgatti e da presidente da
Academia Erechinense de Letras (AEL), Dra.
Helena Confortin – todos muito
bem
elaborados com vistas ao evento a realizar-se de 22 a 29 de abril na Praça
Jayme Lago,
permito-me reproduzir na íntegra a fala do homenageado da feira,
que chamou a atenção de
todos os presentes pela conjugação de termos não tão comuns em discursos - dando
um brilho especial ao evento. À bem da verdade todas as manifestações abordaram a feira
com riqueza, cada qual seguindo seu próprio estilo.
Francisco
Basso Dias - Chico
“Distintas
autoridades que compõem a mesa...
Presidente da Câmara Municipal de Vereadores, Sérgio Alves
Bento;
Carla
Talgatti, Secretária Municipal de Cultura;
Helena
Confortin, presidente da Academia Erechinense de Letras;
Patrona
da Feira do Livre/2023, Joemir Rossett...
Senhoras
e senhores...
O
Grande Rui Barbosa, quando retornava à sua terra e recebia uma homenagem dos
seus conterrâneos disse uma frase, no início de sua alocução de agradecimento,
que copiei e repercuto no início desta consideração para comigo:.....
“Depois
disso, diante disso, não sei como principiar...”, ou seja, iniciar, começar... o
meu agradecimento por receber carinhosamente esta homenagem que me deixa um
tanto emocionado.
Minhas
palavras neste momento não são apenas protocolares, na qualidade de
homenageado, mas falo também como comunicador de rádio com 70 anos de carreira.
A
Feira do Livro de Erechim, traz um retrato instantâneo de nossa produção
editorial contemporânea.
Como
se trata de livros, traz também muito mais do que isso: um convite à descoberta
de nossa literatura.
Nestes
tempos contemporâneos, pelo mundo afora, somos todos vítimas de uma certa
prisão a imagens pré-determinadas, que prometem um resumo rápido de todo um
povo e uma cultura.
Porém
nem sempre essas imagens são fiéis.
Uma
palavra detona logo uma imagem que pretende esgotá-la, sem perda de tempo. E a
imagem do Brasil não é associada a livros. Ou seja, o Brasil não é considerado
(me desculpem) um país literário – diferente de alguns de seus vizinhos. Os
estereótipos que se colam aos olhares lançados sobre nós se voltam muito mais
para a cultura daquilo que é imediatamente apreensível pelos sentidos - o
corpo.
Mas,
um corpo em que o cérebro costuma ser esquecido, como se não tivéssemos
espírito, na celebração da dança, da música, do futebol, da capoeira e outros
esportes, da sensualidade, das peles bronzeadas que se exibem nas praias, do
carnaval, dos sabores da caipirinha.
Mas,
nós brasileiros somos muito mais do que isso, no amálgama cultural e étnico que
nos constitui, capaz de criar tudo isso e muito mais, a partir de um rico
patrimônio indígena encontrado pelos europeus que chegaram ao nosso país,
dos diversos aportes dolorosamente transplantados da África em porões de navios
carregados de escravos, da bagagem acumulada e trazida por imigrantes europeus,
asiáticos, e do oriente médio, de variadas origens – todos colaborando para
moldar uma forma única de nos expressarmos, capaz de dar uma contribuição enriquecedora para todos
nós.
Então,
ao agradecermos o convite para esta homenagem, vamos mergulhar nas águas desta
multiplicidade, desta identidade aberta, feita de diálogos e cruzamentos
culturais. Agora, cabe apenas uma
advertência: não venham procurar o exotismo e o pitoresco, nem a se dar por
satisfeitos com a denúncia automática dos óbvios problemas, repetidoras de
clichês.
Procurem
ir além da mera confirmação de estereótipos simplificadores. A literatura que
se faz no Brasil tem muito mais a lhes oferecer - em sua variedade de
protótipos, sua inquietação, sua inovação formal, sua inquietação, seus
variados registros de diálogo irônico com o cânone em piscadelas literárias de
todo tipo, das mais refinadas e sutis às mais divertidas e escrachadas
paródias, pastiches, intertextualidades.
A
sociedade e a política brasileira estão sempre rondando, por perto, por baixo
do que se publica entre nós. Esse substrato político na escrita é uma das
nossas marcas. Em seu conjunto, nossos livros levantam indagações, reflexões,
diálogos críticos com o real, hipóteses do imaginário, a partir de fatos de
nosso cotidiano e de sabores por eles despertados em cada um de nós.
Trazemos
autores de procedências diversas, com suas falas pessoais, visões peculiares e
irrepetíveis. Uma soma. Um mosaico, talvez. Um tecido de fios entrecruzados, de
desenhos imprevisíveis e surpreendentes. Quem tiver o cuidado de examinar de
perto essa urdidura terá também a revelação de avessos instigantes e
desafiadores, pessoais, únicos, típicos das texturas e dos textos artesanais,
abandonados nas produções em série dos grandes teares industriais.
Tudo
isso contribui para compor uma literatura de grande vitalidade, num processo
dinâmico que se movimenta sempre, construindo possibilidades insuspeitadas
pelos olhares comodistas e superficiais.
Este
é um convite para que venham encontrar essa literatura plural, múltipla,
diversa, em que os regionalismos eventuais se esgueiram pelas frestas de um
cosmopolitismo inesperado, construído sobre a intensa riqueza de uma cultura
oral vigorosa que ajuda a sustentar refinadas invenções vanguardistas, sem
deixar de dialogar com ecos de uma cultura de massas dinâmica, onde técnica e
improviso ousadamente se dão as mãos. Ao
pagar o preço histórico de só termos conseguido escolarizar plenamente nossas
crianças nas duas últimas décadas (e ainda assim, de maneira precária, com
baixa qualidade no ensino), e de termos grande parte de nossos professores
oriundos de lares analfabetos, sem intimidade com livros, esbarramos também num
acelerado processo de urbanização e desenvolvimento tecnológico, numa rede de
comunicação de massa onipresente e criativa, de alta qualidade e de elevado
padrão técnico.
Em
grande parte, saltamos diretamente da cultura oral para a televisão e o mundo
digital sem fazer escala na Galáxia de Gutemberg. Mas desse processo histórico
injusto, a refletir as desigualdades do país, nossa cultura tira uma força
única, com uma produção de grande vitalidade e diversidade, combinadas de
maneira muito própria, em original contribuição que surpreende quem chega perto
desarmado de preconceitos, disposto a se deixar impregnar por ela.
A
nossa Feira do Livro é um retrato instantâneo deste momento.
Encerro
pois estas palavras repetindo o convite a cada um para que se aproxime de
nossos livros e venha garimpar tesouros nesses ricos veios, em busca de suas
descobertas pessoais. Há livros para todo gosto, e seguramente cada leitor
saberá encontrar o seu. Provavelmente, mais de um se revelará atraente. Para
isso, basta chegar perto, procurar ler, enfrentar o desafio de ir além da
superfície e não se limitar apenas aos que nela flutuam, selecionando somente
os que confirmam o que já se espera achar. Garanto que boas surpresas estão à
sua espera.
Sejam
bem vindos.
Desculpem
as autoridades que aqui estão, e agora finalizando, eu quero compartilhar esta
homenagem que é muito significativa para o meu ego, com os jovens...com os
estudantes....
Deixando
como última mensagem o seguinte: A leitura é algo importante na vida das
pessoas, e acima de tudo, para o desenvolvimento intelectual e cultural do ser
humano. Ler estimula a criatividade, melhora a escrita, ajuda no funcionamento
do cérebro e exercita a memória, além de outros benefícios. A leitura pode
mudar o mundo. A leitura é descobrir sentidos. É a reinvenção da realidade. Uma
boa leitura nos faz compreender o mundo a nossa volta através de diversas
perspectivas e é por meio desse processo que se torna viável construir novos
significados a partir de cada objetivo.
Obrigado!!!!”
Nota: (Francisco
Basso Dias é, atualmente, o radialista mais veterano
(87 anos) a exercitar diariamente o ofício na radiofonia do Rio Grade do Sul).