domingo, 20 de dezembro de 2020

Quando eu fugia das vacinas no Mantovani

 

Foto /Beto Hachamnn/Divulgação
1

Eu contando assim não tem graça.

Sim porque ninguém acredita.

E nem tenho a pretensão de convencer.

Agora – quem quiser continuar lendo, que leia.

Pela singela razão que é a mais pura verdade.

2

Houve um tempo,

onde as noticias chegavam aqui dois

– três dias depois.

Às vezes uma semana depois.

O que aqui acontecia aqui - seguia por carta.

Isso mesmo – por carta.

Para o Correio do Povo por exemplo.

Eu vivi isso. Não me contaram.

As fotos sobre notícias iam por carta.

O Delcy Maloz mandava.

3

Também não é menos verdade,

que as noticias da 2ª Guerra,

por exemlo,

chegam à Voz da Serra por pela AFP e UPI,

via telex.

Só que o jornal saía um ou dois dias depois.

4

Acho que estou nos anos 1960 ou 1970 agora.

Tu acredita que as pessoas passeavam na

Maurício Cardoso – assim, de mãos dadas!

As mulheres se enganchavam umas nas outras,

e os homens ficava um ao lado do outro

encostados sob as marquises.

Era uma fumanceira só: todo mundo

fumando e... tossindo.

E que nada – puxavam o lenço do bolso,

às vezes já molhado – credo!

E passavam no nariz e vá de novo

no bolso detrás da calça.

Tu saía da matiné e se fosse brincar

de filme de mocinho,

a primeira coisa que o bandido tinha que fazer,

pra ser identificado,

era....

botar uma máscara.

E, se possível com cabelo meio comprido,

desalinhado e, claro, a barba por fazer.

Assim, assim – com cara de meio sujo.

Não havia gente boa de máscara.

Mascarado – era, atenção! – cuidado.

5

No Café Grazziottin não cabia mais ninguém.

Todo mundo junto, como se diria um dia

no  futuro - aglomerado.

Naquele tempo não era esse o termo.

Era juntos, unidos, conversando...

E vá cigarro e cerveja.

E vá tosse,

nariz escorrendo,

gente espirrando e o garçon,

em cima,

quase babando

– “vai mais uma!?”.

Contava o dinheiro passando

nota por nota

depois de molhar o dedo na língua,

lógico.

6

E o berro D’Água então!

Mais lotado que o Santuário de Fátima

em dia de romaria.

E lá também: uma fumaceira só.

Era de vela, de cigarro, da churrasqueira...

Assim também no Caixeiral –

“um em cima do outro” querendo entrar.

Quando um tossia ou espirrava

logo ajudavam: “cuidado que pode

virar numa  gripe”.

E o mesmo vale para o Atlântico,

Comércio,

para o Esperança

e Círculo Operário.

Gente, gente, gente e mais gente

bebendo e se abraçando.

As mulheres então

– era aquela troca de afagos e beijos.

Os homens – um mais suado que o outro,

só faltavam também se beijar -,

principalmente depois da meia noite,

e de uma meia dúzia de cervejas

ou dois litros de uísque.

Que tempos!

7

Nos carnavais,

ao tempo dos QGs,

era churrasco, fandango, trago e mulher.

O único álcool que rolava era da bebida.

Nos velhos tempos quando a fantasia

ainda era “chic” –

aparecer de máscara,

tapar o rosto,

era quase uma ofensa.

Como saberiam quem era aquela ou aquele!?

A não ser a mulher com uma...

Musseline a encobrir-lhe o rosto,

enfeitando-a de leveza e elegância

- assim, com um toque de sedução.

8

Aos sábados e domingos

as igrejas se viam pequenas pra tanta gente.

E “bom dia pra cá”,

“até domingo que vem” pra lá,

e tudo, claro, depois de um caloroso abraço.

E ai dos filhos e netos se não aparecessem

com a prole toda para o almoço.

Quanto mais ranhenta a gurizada

– mais o vô parecia que gostava:  ele

Se divertida. É saúde fio, saúde!

Vem aqui. Vamo passá um pano... guurrggrrrrr, cof, cof, sccchlépppp!

“Oh Véio, não me pega o pano da loça

Pra enxugá o nariz do Júnio!”,

ajuntava a avó enquanto descascava

as batatas para a maionese e,

de vez em quando,

escapando uma tossida sobre o que iria

para a mesa ao meio dia.

9

Eu sei que contando assim,

parece mentira,

mas já houve um tempo onde os jogos de

futebol tinham público.

Verdade!

Não acredita?

O pessoal ia, se juntava

– não, juntava é muito velho,

se aglomerava,

como dir-se-ia décadas depois,

perto da copa

e nos banheiros como um enxame de abelhas.

E era xixi fora do lugar,

mãos mal lavadas ou nem isso,

e logo o antebraço ou o dorso da mão,

enxugando os beiços.

Copos de plástico derramando cerveja

pelas beiradas,

e aquela babação toda: “tu viu o que

o nosso tanque aprontou?

Só não entrou com bola e tudo

porque não quis”, ahahahahah...

E no 2º tempo vem mais

– ajuntava um terceiro babando

e se cuspindo todo no meio do bolinho

de torcedores.

Sim, torcedores de carne e osso e...

saliva.

E bota saliva naquilo.

Que nada – todos estavam torcendo pro

mesmo lado.

Era uma família daquelas unidas: no suor,

nos abraços, nos sem camisa,

no xixi no chão, no pastel dividido,

no amendoim, na pipoca,

no copo de plástico com cerveja

compartilhado, no pito, na tosse,

no acesso de tosse de quase afogar,

uuuurrrrrggggrrrrrrfffffggggg.... na saliva, na babação, no empréstimo

de lenço...

Que anos. Que anos!

10

Na segunda-feira desde cedo era agitação.

Eu já saindo cedo pro serviço e as crianças

pro colégio.

Ninguém com papel, ninguém com lencinho

e, o quê? – tá querendo levar álcool?

- mas tu não larga mesmo, né!

11

Álcool gel? – mas, mas o que é isso?

O quê?

Voltar do mercado e passar álcool nas

sacolinhas?

Na sola do sapatênis?

Passar álcool nas mãos ou dar um banho

com sabão nas mãos cada vez que vinha de fora?

Tá ficando louco ou só caduco mesmo.

Olha, contando a gente não acredita mesmo!

12

Todo mundo saía de casa.

As crianças iam brincar,

os adultos trabalhar e tudo misturado

– enquanto os mais idosos tinham ordem

expressa dos filhos: “não me não fica em casa.

Vai na vizinha ou num bar jogar cartas

– mas saia da frente da TV.

Passa a tarde fora de casa!

Quer acabar entravado numa cama!?

Vamos – se mexer.

E cuidado – não dá bola pra ninguém.

Se aparecer alguém com a cara tapada

– dobra a esquina, chama a Brigada ou corre

num vizinho.

13

Numa Frinape houve um show

com uma banda “Cover” dos Beatles.

Parece que eram argentinos.

Tu acredita que não tinha nem,

nem duas mil pessoas?

Estavam meio apertadas – mas só duas mil?

Um fiasco! – E olha, que banda.

Parecia os Beatles de verdade!

Só Campo Pequeno mesmo pra não juntar,

com boa vontade, vá lá - de duas

a três mil pessoas. Eu juro,

como os Beatles!

14

Nas romarias de Fátima teve ano

que não deu 20 mil pessoas.

Uma vergonha!

Teve desfile de 7 de setembro

até com menos 10 a 15 mil na avenida.

Outra vergonha.

Quando havia, ih, nem me lembro mais,

mas quando havia Acampamento Farroupilha,

teve noites com menos de 3 mil pessoas.

Imagina!

Bom mesmo era quando o “acampamento”

saía no seminário,

aí dava mais de 10 mil pra fora.

Todo mundo meio na cachaça,

lambuzado de churrasco,

e claro,

passando galpão por galpão

– mesmo com febre, espirro

e “nariz escorrendo” -,

mas tinha que fazer porque se não

ia passar vergonha.

E o diabo do respeito!? -

aonde fica. Então que se honrasse

a recepção e se visitasse um por um,

passando todo mundo – meio, uuurggggffff, schlép, schéééppp, atchiiimmmmm!

Eia – tosse desgraçada.

Em casa depois,

tinha gaúcho que ia pra cama

de bombacha e tudo.

Barbaridade: acho que se tomava

chimarrão em mais de 30 cuias!

 – e um melhor que o outro.

15

É, meu amigo.

Contando assim a gente nem acredita

que um dia tivemos tempos dessa rotina.

Naquele tempo

– comemorar um aniversário –

era coisa para estar junto, abraçado.

Nada de mensagenzinha e coisa e tal

– boa parte delas até meio duvidosas

quanto à veracidade dos desejos desejados,

mas naqueles tempos era churrasco,

salgadinho, torta, refri, cerveja

– e vá abraço e abraço.

O “parabéns a você” era cantado

com tanta vontade que o ar saído dos pulmões,

e a saliva que voava,

fazia o fogo da velinha sobre o bolo - dançar.

Se o nariz de uma ou outra criança

começasse a escorrer

– se apanhava um guardanapo e limpava

e... seguia a festa.

E tudo ali em cima da mesa: palito,

guardanapo, resto de salgado, torta pela

metade.

Será que esse palito não foi usado?

Azar... se era de alguém.

Quem se pegava sem colherinha,

Apanhava, assim... a primeira que aparecia.

Alguém já usou?

Mas – que pergunta mais

sem vergonha é essa?

16

Quando um familiar, parente

Ou só amigo ficava doente

e internava no hospital,

a gente ia visitá-lo.

Era o mínimo.

Importante era mostrar consideração.

Entrava e saía

– e ainda levava alguma coisa pra

mudar um pouco o cardápio do doente.

Ninguém dizia nada.

Ninguém fiscalizava nada.

Ninguém de incomodava

e até agradeciam pelas bananas e maçãs

que levávamos ao hospitalizado.

Na hora da visita então,

Havia quarto com oito ou 10 visitantes.

Todo mundo ao redor da cama do acamado.

Era uma felicidade geral,

ainda mais quando o doente dana sinais de

melhora.

Que alegria!

Ouvi dizer que viria um tempo

em que se você tiver alguma coisa,

e achar que precisará ir ver logo um socorro,

que nada,

seria rechaçado: “não apareça no hospital

porque é lá que mora o perigo”.

Viria uma tal de internet

- nem sei que bicho é esse ou isso,

mas que a gente poderia se falar...

e uns dizendo que seria pra ir correndo

pro Pronto Socorro

e outros que seria pra

correndo.... fugir.

17

Tu acredita que a gente conhecia

quem vinha vindo lá a uns 10 ou 20 metros.

Ou até a 50!

No mercado,

Recém inaugurado;

a gente fazia rodinha

pra falar de futebol, de política, do prefeito,

de mulher ou dos preços

– e quando um tossia sobre as frutas,

queijos e salames -,

a observação era para se que tomasse

uma cangibrina com mel e limão

ou então, em último caso,

um óleo de rícino

porque podia virar numa pneumonia.

Que tempo. Que tempo Santo Deus!

18

“Porto Alegre é longe...

Tô pegando o ônibus pra te encontrar”...

mas eu acendia meu cigarrinho e ia.

Em Vila Assis - fumava mais um três.

Uma balinha de menta pra disfarçar o cheiro.

E lá se ia o ônibus da Unesul

descendo a serra, numa fumaceira

entremeada com acessos de tosse

– e ninguém, ninguém tinha medo de nada.

Chegávamos em Porto Alegre,

com os olhos vermelhos de sono e fumaça,

mas que nada. Uuuggghrrrffffff, cof, cof,

schléééépppp.

Que maravilha

– aquela poluição inundando nossos narizes

e aquele mundaréu de gente

todo mundo dando a cara à tapa,

sabendo-se de longe quem era.

19

Olha – acredite se quiser,

mas foi um tempo que eu acho,

que não volta mais. Nunca mais.

A gente se benzia na igreja com água benta

– mas já se falava que viria um tempo

onde o benzimento seria com álcool,

um tal de álcool gel.

Mas - seria bento mesmo!?

20

Já houve um tempo onde quase

não tinha televisão.

Então – os cinemas eram o ponto

de encontro e lazer.

E olha – pra tu pegar uma poltrona vazia

no ideal ou no Luz -,

tinha que ir mais cedo.

Atrasado - tinha que ir pedindo licença

pra quem já estava sentado

e ir passando, passando,

licença, licença...

meio que se babando,

se cutucando, roçando

e quase caindo por cima de quem

já estava sentado,

até chegar na poltrona que ainda

estava dando sopa.

Se alguém espirrava,

ninguém pedia para o cara sair.

Só se ouvia um chiiiuuu.

Quando a sessão terminava,

todo mundo se acotovelava pra sair

um antes que o outro.

Depois se juntavam Três Xirús

ou no Bar Artur

e vá torrada, cerveja e general.

Que tempos aqueles!

21

Mas falar assim como falo

daqueles tempos,

é quase como alguém contar

sobre como viviam na Grécia

ou na Roma antiga.

Claro que era muito diferente.

Viver – viviam, mas há 50, 30 ou dez anos...

Assim como um dia,

lá pelo ano 2020

ou sabe-se lá quando...

não será como foi naqueles “séculos”

que ficaram para trás,

“séculos encurtados” que não fazem

Nem, nem...nem dez meses.

22

Olha, sei que posso estar exagerando,

mas contando assim ninguém acredita.

Imagina só: já houve um tempo

onde as crianças e adolescentes

se reuniam todos num mesmo lugar.

E pra quê? Pra estudar!

Isso mesmo.

Eram prédios, sim prédios,

de concreto com dezenas de salas de aulas.

Iam todos no mesmo dia,

na mesma hora e, até faziam fila

para entrar.

Crianças e adolescentes.

Um atrás do outro e, até

depois, mais tarde acabaram com as filas

porque era “careta”... careta – mas

o que isso? Esquece. Esquece.

E sem fila entravam todos juntos.

Havia até uma sineta ou campainha

que anunciava a hora de entrar e sair.

Quem chegava atrasado, e quase sempre

meio sozinho, esse...

eles nem deixavam entrar.

“Tá pensando o quê? – por que

não veio junto com todos os outros?

Cada sala,

pensa só,

tinha no mínimo, no mínimo uns trinta.

Na sala dos professores

- professores de todas as idades e de todas

As tosses, resfriados e... quetais.

Uns fumavam, até que chegou um dia que

baixaram um lei que mandava fumar

lá fora. “Estão pensando o quê!”.

Atchhimmm.

E na hora do recreio então?

Largavam todos juntos

– e uns iam pro refeitório

e o resto correndo e suando pelo

pátio da escola.

A gente, contando assim hoje em dia,

ninguém acredita – mas creia,

é a mais pura verdade.

23

Quando me lembro das romarias de

Caravaggio, da Madianeira, de Fátima...

o pessoal lotava trem e ônibus pra ir

pra Marcelino na romaria da Salete.

Almoçavam nesses eventos

- assim, esparramados pelos gramados,

todo mundo junto e,

quanto mais junto melhor até.

E de tarde nos jogos das argolas,

nas bochas, no sinquilio, nas roletas e

na venda de rifas – aquele mundaréu de gente.

E o que dizer

- quando da benção da saúde,

isso mesmo,

da saúde,

e aí mesmo é que era a hora

do ajuntamento geral.

O pessoal que vinha do interior,

só voltava pra casa depois da benção,

veja só,

da benção da saúde – com todo mundo

grudado, suado, ajuntado,

se acotovelando mas – com saúde.

Que tempos. Que tempos!

Condomínio Erechim/1958
Foto/Reprodução A Voz da Serra


24

Eram tempos, veja você,

onde quando se falava em... China,

meu Pai – nem quero pensar...

era, era, era....

Que mapa que nada.

Que comunista que nada.

Era pegar o táxi do Zanon

e se mandar lá pros lados antigos,

muito antigos –

do “campo da aviação”.

Ou, se mais antigos ainda,

lá perto de onde sairia o prédio da Brigada.

O termo seria um dia,

ou já estava,

incorporado ao vocabulário gauchesco.

E era – aquela confraternização generalizada.

Mas já naquele tempo com álcool.

Pelo menos os 5% da ceva.

Dois, três dias depois

- havia farmácia onde

a benzetacil esgotava.

Quanto Paulinho da Viola, Martinho da Vila

Demônios da Garoa, Adoniran Barbosa,

Agepê... no Bar do Alcemo nas madrugadas

que o tempo engoliu,

deixando no máximo um ou outro

resfriado.

Que tempos.

Que tempos!

25

Não quero nem entrar nas discussões

sobre vacina.

Só me lembro que naqueles “séculos”,

naqueles tempos dos anos

1960/70 e...

até quase os tempo de ontem;

em dia de vacina no Mantovani,

sempre me dava uma dor de barriga

insuportável só pra não ir.

Fincar uma agulha no braço?

– que nada.

Sim, porque nos meus tempos emburrecidos,

Eu... não tinha nada!

Na época? - eu fora.

Mas, no final das tentativas,

sempre “fracassava”.

O chinelo cantava e lá estava eu,

com o braço fora da manga da camisa branca,

sempre para ser salvo de um mal futuro,

que a “burrice” não me deixava ver nem

aceitar.

Desconfio que se tivesse

entrado na política naqueles tempos

- e considerando minhas credenciais

de conhecimento e aceitação sobre ciência,

corria sério risco de até virar presidente de uma republiqueta.  

26

Eita que saudade do centro.

Sim – do centro da cidade.

Nos sábados à noite as praças estavam cheias.

Crianças correndo, mães enganchadas nas

vizinhas, e homens fumando um atrás do

outro.

Nos cafés jogo de bilhar.

nos clubes como no Atlântico,

bolão e bocha até a madrugada.

Mondongo com vinho às 7 da manhã,

era prato de malandro.

Quase ninguém tinha carro.

Carro mesmo, “à baloque”,

só os de praça.

Aos domingos as missas das 6 e das 8 ferviam

De fiéis.

Todo mundo grudado.

Nas matinés – quase sempre faltava lugar.

Todo mundo grudado.

E à noite, aos domingos,

aquele “ajuntamento” – não se conhecia,

termos que virão (ou viriam)

só lá em 2020 segundo os astros,

tais como aglomeração.

27

Em tempos de eleição então...

Se entrava em todas as casas.

Erguia-se criançinhas.

Beijava-se mulheres sem dente, o nono, a nona, a vizinha, os sobrinhos, com compadres

e, dividia-se chimarrão feito em xícara branca

de alça quebra.

Chupava-se picolé feito na casa do eleitor.

E era aquele uuughhhhrrrrrrrrr – depois de um

baforada do nono no seu palheira. Mas que

nada. Esse é um voto garantido, né nono.

Os pés ardiam de tanto andar por

ruas, praças e potreiros.

Sempre rodeado de uma infinidade de

cabos eleitorais.

Era sangue, suor e lágrimas pelo voto.

Eram churrascadas sem fim.

Noitadas pós-comícios igualmente a perder

de vista.

Quem acusasse alguma “doença” até era

tratado como “traíra” n’alguns casos.

Ninguém, mas ninguém queria saber da

falta de saúde do outro.

O importante era todo mundo estar unido.

Quando o Brizola discursou num dia de semana

na esquina democrática – mais de 15 mil

tomaram a Maurício, a Nelson Ehlers e a Itália.

E era aquela felicidade

- mesmo entre cof, cof e egrrrrrfffffff,

cooofff, bleffff, atchim, atchim, eaaaagrrrrffffff.

Ninguém estava nem aí.

Que tempos – minha gente. Que tempos!

28

Ir a um médico era indicativo de,

ai que perigo – só pode ser, ai que perigo;

só pode ser a “penicite” (apendicite),

que sempre parecia ameaçar querer estourar,

quando a dor na barriga enfeiava.

Eu que o diga!

Jogando bola num domingo

perdido no tempo,

lá em Sede Dourado,

de repente me deu uma dor no lado direito

da barriga.

Rolava de dor.

Logo alguém gritou: “estourou a penicite!”.

Tiverem que me trazer direto pro Caridade.

Fizeram um raio X e me botaram num quarto.

O médico veio na segunda de manhã e

setenciou: ele agüenta até amanhã.

Amanhã cedo vamos operar.

Só me lembro que meu pai ou minha mãe

comentaram: “Ih – vai entrá pra faca. É penicite!”

Eu sabia. Sempre era a maldita!

Quando me acordei na terça à tarde

parece que tinha “morrido” por um tempo.

No segundo quarto da direita para a esquerda,

na parte frontal do velho HC

com “cara” só pra Comandante Kraemer

lá estava eu – recém operado.

Na hora da visita o quarto foi se enchendo de

parentes, vizinhos e amigos.

Uns meio resfriados,

outros tendo acessos de tosse de quando em

vez – e a cada piada que contavam,

salivavam pros quatro cantos do quarto.

E eu, ali, deitado,

com a barriga meio aberta, meio fechada

costurada

- e uma mesinha cheia de bananas, maçãs,

bolachas, bolo...

As enfermeiras entravam e saíam sorridentes.

“Vai ficar bom, logo, logo”.

Meu maior lamento viria dois meses depois:

ainda com um dos pontos querendo abrir;

no grande corte que sofri na barriga

pra retirada do apêndice

- não pude jogar na preliminar de Ypiranga

e Inter na Montanha.

Como eu lamentei aquilo.

Jamais me esqueço.

O Inter podia ter me levado.

29

Quando o futuro finalmente chegou,

e a humanidade evoluiu como jamais se

sonhara

- acordo aqui,

trancado, rodeado de bisnagas de álcool,

proibido de ver o outro de perto.

Apartados de tudo e de todos.

Tudo pela preservação da vida.

Estou confuso.

Não sei mais se saúdo

Que tempos, que tempos! - eram aqueles;

ou se ergo a voz e grito

hoje, já no futuro:

que vida,

que vida... meu Deus!


Obs: esta tentativa de crônica, quilométrica, contrapondo hábitos temporais, não diminui em nada a dor, o lamento e a solidariedade desta coluna para com as vítimas e familiares de vítimas deste novo “mal do século”, o Covid – 19 que tanta tristeza já espalhou pelo mundo afora. E observe-se, ninguém está livre de ainda ser contaminado. Que a vacina seja maior que as pendengas ideológicas e políticas e chegue para todos. Que a ciência prevaleça. É que a gente já viveu tempos tão inesquecíveis – que quase nunca nos lembramos de agradecer. Por isso - agradeço aqui aos velhos tempos. E lembrar, que eu tentava fugir das vacinas do colégio no Mantovani. Santa ignorância. Talvez por ingênua e pura – fosse realmente santa.

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

domingo, 13 de dezembro de 2020

As crônicas de Cleo Ortigara em SC


1

A vida é mesmo feita de etapas. De períodos como se fossem compartimentos independentes, mas habitando uma mesma vida. Pois, foi com imensa alegria que recebi um exemplar do livro “O não dito foi escrito” de autoria do primeiro reitor da URI, Cleo Joaquim Ortigara, hoje residindo em Balneário Camboriú onde saboreia sua merecida aposentadoria.

Trata-se de uma obra de crônicas com textos objetivos (mas como lago de águas paradas –profundo), apanhados de observações do dia a dia. Podem partir de fatos, de leituras, de observações durante caminhadas à beira mar, de uma encomenda recebida, de conversas aparentemente sem grande importância, de lembranças, de decisões políticas, ou até mesmo do valor de um Bitter Águia.  Muitas crônicas têm como base a história do mundo, onde as escrituras abastecem como fonte inesgotável, apanhados, transformados em textos trazidos para comparativos com o nosso tempo, mas sempre fechando com uma mensagem que nos leva à reflexão. A propósito, a crônica não tem outro sentido senão o de externar aquilo que o cronista apanha e transforma numa ideia, num pensamento, numa opinião pessoal que pode, e deve levar o leitor a pensar, refletir, concordando ou discordando, porém, sempre, assim que chegar ao ponto final, levantar a cabeça, deitar sobre o colo o lido; e levantar o olhar para os horizontes – da terra e da consciência. E isto o professor, reitor e agora apreciado cronista com obra já na praça, tem conseguido alcançar com maestria. É, considerando o que perdemos por conta da pandemia, uma criação, um presente que “o professor Cleo” nos oportuniza. E para quem escreve, ele sabe, um bálsamo à sua própria alma.

2

Não por nada que uma repórter do SBT catarinense o procurou na cancha de bochas à beira mar para uma entrevista. Lá, Cleo coordena um grupo de quase 100 idosos, a passar o tempo jogando bochas e outros passa-tempos de mesa. Não por nada ainda, o próprio Cleo, revelando agora aos catarinenses ou aposentados de outras querências do país que foram viver seus últimos tempos à beira mar, interessa-se e labora pela situação de vida dos próprios idosos, acompanha em visitas os adoentados e, se necessário, até une-se em ajuda às famílias quando da despedida final de alguém daquele grupo.

Como não poderia deixar de ser, também dali saem “ganchos” que rendem crônicas, quando não, suas flores e legumes que cultiva na bela varanda do prédio onde mora. Quem conhece o reitor Cleo, sabe que isso é coisa dele mesmo e nem viveria este tempo sem seus compromissos, nem que seja com um pé de tomate, uma roseira ou uma “árvore de apartamento” que dá pimentões de verdes a vermelhos.

3

Mas nada supera a autobiografia deitada no mesmo livro pelo cronista. A certa altura se lê: ... Lembro do dia da mudança para a casa nova em Osvaldo Cruz, distrito de Frederico Westphalen. Uma casa toda com tábuas de pinho e a satisfação no rosto do pai e da mãe (Bortolo e Vitória)... Se lhes conto tudo que havia nesta nova morada... Frutas de tudo quanto é espécie e em quantidade. Chiqueirão de porcos... Horta sortida e caprichada... Galinhas e angolistas, jardim florido de variadas cores... Água de fonte entijolada, porão entulhado de varas de salame, tábuas de queijo, latas de banha e mel. Tranças de cebola e alho, sacos de amendoim, tulhas de farinhas, sacos de feijão de várias cores. Acompanhei a plantação do parreiral quando guri para depois irem às pipas de vinho, latas de mascavo, travesseiros de pena. E as melancias e melões? De fora só vinha sal e tecido para calças, camisas, vestidos e lençóis, tudo na ‘Singer’ pela mãe”.

E segue: “luz de lampião, banho na sanga, patente lá fora, colchões de palha de milho, micuins aos borbotões, porcos a tratar, vacas a ordenhar, cacarejadoras a botar ovo às escondidas, frutas às pencas, caixas de abelhas... Em tempo de pinhão, serelepe, lá ia eu pendurado com uma vara comprida cutucando as pinhas... Pitangas, ingás e ariticuns. Uma bola de pano em campinho de potreiro e as solas dos pés infestadas de rosetas...”. Me lembra as beiradas das quatro linhas da Baixada Rubra, hoje Parque do CER Atlântico, onde na minha infância também tive meus dias de pés crispados de rosetas.

4

Seguindo a cronologia, é sem dúvida uma narrativa reconstruída pelo autor quase como se fosse uma fotografia daqueles tempos, por certo, felizes para o então ainda criança e adolescente Cleo – um dos treze de Bortolo e Vitória. Tudo se precipitaria com o passar do tempo para sua profissão de professor (onde conhece sua futura esposa) e assumir cargos de gestão na área da educação. Antes, com sua malinha de madeira, andaria por várias cidades tidas centros educacionais como Santa Maria, Ijuí e até pelo Seminário de Fátima de Erechim, onde fez parada na época da construção do Colosso da Lagoa. Em Santa Maria conheceu o internato. Aos domingos, de batina, os candidatos a padre eram os “urubus” na boca de estudantes da universidade, relata. Queria ser padre, mas o Pai Celestial o guardaria para missões ainda maiores.

Sem temer desafios e até sentindo-se quase que na obrigação de sempre ter algo inovador para experienciar e ver no que dava – Cleo Joaquim Ortigara representaria Frederico Westphalen no “Grupo Tarefa” - agulha e fio que costuraram por anos aquilo que daria origem à Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI). Mara Regina Rösler representaria Santo Ângelo e Glênio Renal Cabral foi o indicado por Erechim para o imenso e desafiador trabalho de tentar colocar estas cidades (depois vieram Santiago, São Luiz Gonzaga e Cerro Largo) tudo sob um único guarda-chuva educacional de ensino superior. E o modelo também seria inovador. Não haveria dono e, ao mesmo tempo, de todos seria. Optaram por um modelo que se espalhava – o comunitário. Passou a trocar Osvaldo Cruz e Taquaraçu por Porto Alegre, São Paulo, Brasília, a contribuir na reestruturação da Unicastelo, então sofrível acadêmica e financeiramente. Aquele adolescente de FW, e confins, também estaria, mais adiante na vida, na capacitação de avaliadores do MEC. Com a esposa Juracy (dona Jura), e malas agora não mais de madeira, conheceria a América Latina, Portugal, França, Áustria, Suíça, Alemanha, Polônia, Rússia, China, Tailândia, Macau, Hong Kong... O casal desenvolvera em casa, aos domingos, sessões de música. Só clássicos. Dos eruditos à sertaneja, da bossa nova à Jovem Guarda, afora os encontros cativos de família sempre com a presença aplaudida da inconfundível maionese da dona Jura. Pois este é grande segredo deste nó de pinho dos “Ortigara”, poder-se-ia admitir, em se alongando, a partir da família de Cleo e dona Jura com seus irmãos, filhos e demais descendentes. E finaliza o autor sua autobiografia: “Durante toda esta caminhada, não esqueci meu papel como primogênito... O que significa mesmo é o sentimento que nutrimos um pelo outro, estendido sempre a todos os filhos, netos, sobrinhos, cunhados, enfim, aos mais de oitenta da árvore do seu Bortolo e da Dona Vitória...”.

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Como foi gratificante ter desfrutado da oportunidade de poder trabalhar e conviver com alguém, que nem mesmo a aposentadoria foi capaz de lhe retirar ou sequer tolher, a vontade de continuar produzindo e, por que não, sempre inovando – ou a crônica diária é uma obra acabada? Longe disso – é algo sempre em construção, diferente de ontem e amanhã, que em tempos de pandemia ganhou asas e serviu de “desculpas” para o agora autor de livro, resolver fazer das suas, ou seja – não se entregar ao vídeo ou sossegar. Quem não leu – devia. Se até a televisão (pela editoria de cultura interessou-se pela obra), por que não também nós, que conhecemos uma parte da vida deste homem que Erechim devia ter aproveitado melhor. Muito melhor.

Mas faltou-nos este discernimento ou sobrou-nos um certo sentimento, que já sobreviveu por estas bandas, agarrado às nossas teias mais escondidas, e que só agora começa a se desfazer daquele certo ar de preconceito para com quem vinha de fora. E até creio – na maioria dos casos, não por mal, mas por vício (equivocado) de preservação do que é genuinamente daqui.

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Já passou da hora de que Campo Pequeno não é uma espécie de umbigo do mundo e que nós, por nosso berço ou sobrenome, somos imunes a crises. Se por anos convivemos com a catequese de sermos a terra onde corria leite e mel, nos penitenciemos. O perdão existe para isso. É hora, são tempos de um outro tipo de olhar, a dos simples e sábios, onde todos seremos vítimas ou ungidos como salvos. Se de todos os desastres que vieram com a pandemia do Novo Covid-19 não aprendermos isto, que somos todos, rigorosamente todos, iguais – porquanto passageiros; que Deus tenha compaixão e feche um olho para com Campo Pequeno, não nos castigando com outro mal, até que nos dobremos junto com o mundo inteiro.

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Italianos, alemães, poloneses, judeus e afrodescendentes sempre estiveram aqui ou – também eles – vieram de outras plagas!? Aproveitemos, pois, a determinação e as inteligências que vem se somar a nós. Olhemos o que Santa Catarina faz com um chegado lá – como é o caso deste líder - Cleo Joaquim Ortigara. Não sei se esta última observação neste último parágrafo, para alguns, em público - refutável; mas em conversas reservadas e no íntimo de muitos, é exatamente assim, pois, como disse - não sei se pegará mal ou auxiliará para um “mea culpa”. Eu venho fazendo a minha há anos. De outra sorte; peço licença ao autor para fechar este texto aproveitando-me do título da sua obra, porquanto se ‘isto aqui’ - “ainda não foi dito – foi escrito”. Aqui e agora! Com o devido respeito a todos os livres das amarras da falta de compreensão, tolerância e inteligência. O livro do “professor” Cleo encontra-se em livrarias de Balneário Camboriú.

 

 


quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

A NOITE EM QUE O MDB RENASCEU PARA O QUE É HOJE

 

Ana Lúcia Oliveira/Foto: Arquivo Pessoal/Divulgação

@ A histórica vitória do MDB na eleição deste ano não foi por acaso. Há duas razões que entendo fundamentais. A primeira é o carisma de Paulo Polis que possui um capital político na cidade – incontestável e que já se alça entre os maiores dentre os políticos erechinenses. A segunda razão é uma semente. Ela foi plantada em uma noite de 2006 no CTG Galpão Campeiro sob a coordenação de Ana Lúcia Oliveira. Naquela noite o então PMDB – que sempre foi grande aqui - passou do processo de “lavar a roupa suja” para “organizar-se como uma força política com cabeça, pés e membros”. Os resultados vieram dois anos depois com a decisão do partido – e forte participação de Antonio Dexheimer – em levar o PMDB a apoiar Paulo Polis do PT. Polis elegeu-se em 2008 e 2012. Antonio saiu do PMDB, mas a semente de 2006, de renascimento, estava em solo fértil e por rasos 12 votos não deu frutos também em 2016. Saudável, revelou-se na plenitude com força de fortaleza em 2020. Quem não quiser entender o que o PMDB fez em 2006, continuará concorrendo com um cartão da mega na mão. Reproduzo aquela reunião, aquela semente – até para o próprio MDB jamais esquecer-se de como se programou para vitoriar-se. “Quem não sabe por que ganha, não saberá por que perde”. O ditado é velho como o mundo, e novo como nossa democracia. Leiam sobre como a semente foi plantada. A árvore vem dando frutos desde 2008. Os últimos se traduziram em 58,46% dos votos dados a quatro candidatos a prefeito e, cinco, cadeiras no Legislativo. Cinco. Eis a leitura que fiz daquela reunião de 2006: 

 


“A transmutação e os milagres do PMDB

 

1

 

Devidamente respeitada a tese divina de que Deus criou o Homem, a ciência joga todas as suas fichas de que na real, homem e mulher, vem se modernizando há 4,5 milhões até o estágio atual.

 

É um bom tempo, mas ele carrega uma imensa verdade: quando se leva 4,5 milhões de anos, muda-se.

 

Antes que um historiador ou arqueólogo se levante para dizer que não é bem assim, aqui vai uma ressalva: a teoria que se segue é tão somente, “a mais aceita”, porquanto não há uma tese definitiva sobre a história da evolução humana.

 

Antes de surgirem os gibões, os gorilas, os orangotangos, os chipanzés pigmeus, os chipanzés comuns e, os humanos, havia outro elemento ainda não identificado pela ciência.

 

Na Etiópia, por exemplo, há 4,5 milhões de anos, passeava pela floresta humana, sem celular e internet, possivelmente o primeiro bípede de que se tem notícia. Seus caninos diminuíram e alimentava-se preferencialmente de frutas, brotos, caules macios e folhas secas.

 

2

 

Tomando este indicativo – é até plausível conceber que até o PMDB, isto mesmo, até o PMDB pode um dia mudar.

 

O lançamento das pré-candidaturas de Odacir Klein e Gilberto Capoani, no CTG Galpão Campeiro, na última sexta-feira, constituiu-se num divisor de águas – ou talvez fosse mais recomendado usar – “pode constituir-se...!”, mas o que foi permitido ver ainda encoberto é que o PMDB vive.

 

Para quem conhece o PMDB, a convenção ou reunião ou sei lá o que foi aquilo – pois, para quem sabe do PMDB, o evento parecia sim uma reunião, uma convenção, um encontro – mas nunca do PMDB. Ainda mais local e regional.

 

3

 

O som do Santa Maria era claro e sem exageros. As bandeiras discretas, estavam bem dispostas no salão de gala tradicionalista. As mesas arrumadinhas e, nada de papel de mesa de churrasco, aquele usado para fazer pacotes, mas um papel-toalha em verde.

 

O estacionamento tinha pessoal específico, a portaria dava vazão sem atropelos, mas sem interrupções, meio salão foi organizado, desfazendo a má impressão de que de repente passasse uma imagem de “vazio”.

 

É claro, é claro que a turma do Galpão estava por trás daquela organização, mas havia desde cedo, no ar, uma impressão de que o PMDB, naquele ambiente parecia nascer de novo. Devia haver uma mão feminina por trás – com certeza.

 

4

 

Hugo Generali, Jandir Santolin, Miguel Gotler, Antonio Dexheimer, Ângelo Giaretton, Luiz Pungan, Leonel Lanius, Waldemar Detoni Jr., Ana Lúcia e João Elmar Oliveira... Mesa constituída, hino rio-grandense com direito à ser cantado nos diferentes cantos do salão, mesas de peemedebistas de todos os  municípios da microrregional do partido, secretário de Estado, Mauro Gotler presidente da Corag, deputado federal, José da Cruz... Maridos com as esposas, esposas peemedebistas com os maridos; olha, se o Geder Carraro viu “lá de cima” o que eu vi, diria: “Ódyyyy – eu morro e não vejo tudo. O PMDB de Erechim e da região, organizado!? Nããããõoooo!”.

 

Sim, velho amigo, e reparaste na hora dos discursos? Foi aí que eu mais estranhei o PMDB.  Não – não podia ser o PMDB. Quando Antonio Dexheimer falou eu ouvi o estalar de uma brasa lá fora a passar fora-a-fora a carne em espeto. O tilintar das asas de mosquito não foi ouvido, porquanto moscas e mosquitos não havia.

 

5

 

Para quem conhece o PMDB; aquele silêncio, o olhar ao discursante, a atenção, sim a atenção que fez prontidão como nos anos de chumbo quando o MDB abriu-se em guarda-chuva para acolher os contrários ao golpe, pois aquele ambiente, definitivamente, não era o costumeiro da história recente do partido por estas bandas. Parecia o PP quando se reunia para ouvir seu chefe, Eloi João Zanella. Parecia uma reunião do “velho PT” quando ele era ainda um partido sólido como um nó de pinho e íntegro. Com o devido respeito aos exageros, fez de certo modo lembrar o Nazareno, no Sermão da Montanha. Ao menos em “Os Dez Mandamentos” de Cecil de Mille.

 

É lógico que o encontro serviu para apresentar de público, Klein e Capoani, os postulantes peemedebistas nas eleições vindouras; mas muito mais alto falou outra verdade que para mim, por enquanto só botou a cabeça para fora da água. 

 

6

 

Revelou que Antonio Dexheimer, aos 61 anos de idade, continua vivo e atento às questões políticas, e que se mantiver o prumo e passar a agir mais do que teorizar, têm amplas e plenas possibilidades de vestir a mesma vestimenta político-eleitoral que fez dele prefeito lá em 1992.

 

É natural, porém, que tentasse o PMDB com Dexheimer – não uma só coligação, mas uma aliança; e aí as garantias de volta ao poder seriam mais garantidas. E a quem interessar possa aliar-se ou não ao PMDB, fica a certeza de que este PMDB que rebrotou aos olhos públicos lá no Galpão Campeiro, sexta-feira, 26, não tem nada a ver com o PMDB fora de ponto que vinha rolando até bem pouco.

 

7

 

Mais que impressionar, chegou a ser contagiante o respeito, a admiração e a escancarada disposição que os peemedebistas dos municípios do Alto Uruguai começam a cultivar pela sucessora de Valcir Rodighiero, - a nova coordenadora da microrregional, Ana Lúcia Oliveira.

 

Ana Lúcia não deu só um novo ar, um tom feminino, uma fala mais mansa e pontual ao partido, mas parece que deu arranque, faz do PMDB um carro que anda a boa velocidade, contrapondo-se ao vício e vocação atoleira que demonstrava, e não por culpa de um ou outro, mas senão que de todos. Culpa do próprio imobilismo anacrônico que quase matou a sigla na cidade e na região, considerando seu porte de Golias.

 

8

 

Na observação de sexta, recupera o PMDB o porte de partido gigante, mas acresce sapiência de Davi. Organiza-se como um bom time alemão que prioriza a ação física e exercita uma tática quase mecânica, mas não prescinde de seus talentos que também começam a se dar conta que precisam correr e voltar para marcar, e não só ficar lá na frente, esperando na “pescaria”, uma bola perdida.

 

É evidente que mesmo organizado, nenhum partido tem a fiança da vitória; mas os novos ares que se percebem neste partido, sinalizam de que a vida nunca se vai em definitivo enquanto restar uma esperança.

 

E no caso específico do PMDB, parece que ocorreram dois milagres: o primeiro é um ato de contrição que coloca velhos ídolos (até então em franca decadência); e modestos, porém imprescindíveis soldados de todas as horas para os embates do partido, ambos num degrau, no mínimo, digno. Parece que gregos e troianos do PMDB descobriram que ainda vivem, que tem uma grande legenda na mão e que, se quiserem, o time pode mais – muito mais.

 

9

 

Se o PMDB vai eleger seus candidatos da região, ou não, isto é uma coisa. A outra, é que o partido se reergue sob um comando que lhe puxa à frente, e desperta no todo, um sentimento de que é útil e tal qual a história da evolução humana, não precisa conformar-se em viver eternamente se arrastando pelo chão ou pulando de galho em galho, ainda mais quando a natureza lhe fez evoluir sobre duas pernas e o presenteou com um cérebro”.